INQ E aquela, o cocó muito mole das crianças?
INF As crianças… Às vezes dizem que aquele cocó mole das crianças que é…
INQ Das crianças e dos adultos.
INF E dos adultos. Que é é dores de barriga que dão e são vírus viles. Chamam assim umas coisas. Nós cá chamamos-lhe aquilo, quando é as crianças: "Ai, isto foi foi quebranto que lhe deu", ou "Foi assim". Mas [vocalização] lá para lá, isso não acreditarão, não sei. "Isso foi quebranto que deu à criança ou é embaçado, e"… Mas embaçado é verdade.
INQ O que é isso de embaçado?
INF Embaçado, sabe o que é? É o estômago que se vira às criancinhas. E os médicos não dão com isso. Eu dou. Eu componho-as. Eu componho as crianças. Quando é: crianças começam a vomitar muito, a vomitar tudo fora, e a fazerem só cocó muito molezinho, só soltura – chamamos nós soltura – e assim, e eu componho-os.
INQ Como é que compõe?
INF Olhe, componho-os bem. Olhe, deito-os de cima duma mesa ou duma cama. E os meninos, quando estão assim embaçados, impam: ãhh, ãhh, ãhh! Fazem assim. E a barriguinha muito rija. E então, eu deito-os assim em de cima duma mesa ou de cima duma cama, e tenho um bocadinho de azeite num pires – ou numa chavenazinha, ou numa tigela, em qualquer coisa –, e depois eu lavo as minhas mãos muito lavadinhas, desinfecto-as com álcool, e no fim esfrego-as com aquele azeite, e depois aqui… Supomos que isto Supomos que isto assim, isto é a criança e aqui tem os pezinhos, e a gente une um pezinho assim com o outro e o que e se estiver embaçado [vocalização] um pé é maior do que outro. Um dedo cresce – o dedo grande –, cresce mais que o outro pé. E a gente depois, eu depois com com as minhas mãos, molho as mãos assim no azeite, esfrego-as assim muito esfregadinhas, e faço-lhe assim, assim, assim.
INQ Na barriga?
INF Assim, na barriguinha assim. Começa a gente daqui para cima, da, da mesmo daqui das partes assim para cima, a correr assim para cima, tudo para cima, tudo para cima, e a gente dá com o estômago. Quando estão embaçados dá com ele. É assim, vai indo, vai indo, é três dias que a gente o cura e o estômago torna para o lugar dele. Já nem obram mole nem nem vomitam. Eu componho-os muito bem. Muito bem, muito bem! Até já em Lisboa eu compunha muita criança. Estava lá uma uma senhora que tinha só uma menina. E era mãe da porteira… Era filha da porteira, mas ela vivia muito bem, a filha. Estava a pôr a mão como que era ela a porteira, porque a mãe não sabia ler e não a queriam lá, ela é que fazia as vezes da porteira, é que assinava. E depois um dia apareceu-me lá: "Ó dona Ercília! Ai, a minha menina está tão malzinha! A minha menina morre-me! A minha menina morre-me"! "Não morre, não senhor". "Ai, disseram-me que a dona Ercília"… – quem está lá, é tudo "dom" – "Se a senhora… Que lhe dá um jeitinho, se a senhora lá viesse"… "Eu vou, sim senhora". Disse-lhe eu. "Eu vou lá". Cheguei lá, compus a menina, já quando foi ao outro dia que eu lá fui, já não andava. Ela sentia-se cá fora: ãhh, ãhh, ãhh! E já tinha uns três anos. Já era crescidinha. Compus-lhe a menina. Ao outro dia tornei lá, tornei lá outra vez, curei-a. Essa senhora nem sabia o que me havia de fazer. Porque ele diz que já tinha corrido os médicos todos de Lisboa e que nunca nenhum lhe deu com a cura. Era embaçada!