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GIA25

Gião, excerto 25

LocalidadeGião (Vila do Conde, Porto)
AssuntoNão aplicável
Informante(s) Cosme Cunegundes

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INF1 O espigueiro teve uma época que se usou muito. Depois, porquê eu não sei Eu conto isto muitas vezes! : [pausa] E às vezes a respeito da política actual e desta coisa, desta evolução. Porque o mundo levou uma volta e isto é muito diferente daquilo que era dantes. Agora fala-se muito e faz-se pouco e dantes as coisas apareciam feitas, quase não se falava nelas e nem se sabia, não é?

INF2 Sim, sim.

INF1 As obras públicas faziam as coisas, quase não se sabia. E, portanto, tudo isso eram organismos que funcionavam [vocalização] fora do povo. [pausa] E dessa, dessa dessa história que eu estava que eu ia dizer que é De que é que eu estava a falar?

INF2 Dos espigueiros, pois.

INQ Que antigamente hav-, houve uma altura em que havia muitos.

INF1 Ah! Era exactamente isso. Porque houve alturas eu lembra-me e até me rio, tenho falado nisto muitas vezes , que a lavoura Isto acerca de actualmente e de agora, por exemplo, mais do que nunca, que andam esses engenheiros, mandam para aqui, mandam para acolá, mas acontece que a lavoura tem andado sempre desorientada e até um pouco enganada. Porque a lavoura tem tido muito muitas fases em que [pausa] é aconselhada a fazer uma coisa que vê-se, no fim e ao cabo, pela prática, que aquilo não tem jeito nenhum,

INQ2 Não tem jeito.

INF1 não tem aproveitadouro nenhum. Por exemplo, a Dona Cunegundes não sei se sabe: [pausa] o meu filho andou a tirar o curso de empresário agrícola. Naquele tempo davam um subsídio uma ajuda e grande, quase pagavam tudo a quem quisesse pôr bouças a campo. tempo recebe uma circular para deixar cinco por cento, pelo menos, da terra arável a pasto ou abandono.

INF2 Pronto.

INF1 Isto são duas coisas completamente opostas.

INQ2 Uma à outra.

INF2 Ai, Jesus!

INQ1 É uma coisa, um disparate

INQ2 É, é, é um disparate

INF1 Fala-se muito na reforma agrária.

INF2 É.

INF1 se falou na reforma agrária antes do 25 de Abril. [pausa] Não se fez nada. Antes do 25 de Abril não se fez reforma nenhuma agrária. E não se fez porque o povo também colheu logo aquilo muito mal. E na ideia do povo a reforma agrária consistia em ter de dar aos outros aquilo que era nosso, ou ter que trocar com quem nós não gostávamos, ou de ter de dar uma coisa boa em troca duma ruim, e tal

INF2 Exacto.

INF1 O povo [pausa] E eu nesse tempo dizia: "A reforma agrária é uma das grandes obras", para mim. Uma é a reforma agrária e outra é o emparcelamento. Não sei se actualmente [pausa] merece a pena [pausa] porque nós estamos um bocado longe dos outros, não temos possibilidades que têm os outros, por um lado, e por outro lado, porque Portugal tem [pausa] uma parte muito pequena de terra boa, de terra que, na verdade, mereça. Toda a terra tem aproveitadouro. [pausa] Mas [pausa] no nosso país um problema grande: é que as culturas e tudo fica muito caro e nem toda a terra tem condições que permita adequar

INQ2 Pois.

INQ1 Eu tenho visto ali para os lados de Lisboa,

INF1 Não se vai fazer um

INQ1 plantarem eucaliptos em terras de, de água, ao dos rios

INF1 Tudo tem a sua, o seu o seu espaço próprio. Não se vai fazer um arranha-céus nas fraldas da Serra da Estrela. Nem se vai fazer um arranha-céus no meio dos montes, em qualquer lado. Pode-se fazer na praia porque se sabe que se aluga tudo e que no fim ele o que falta é casas, não é gente. A reforma agrária no nosso país [pausa] devia consistir nisto: emparcelamento é útil mas sem prejuízo [pausa] dos próprios.

INF2 Sim.

INF1 Sempre sem prejuízo dos próprios.

INQ1 Rhum-rhum.

INF1 A reforma agrária, o primeiro passo ou coisa essencial a ver era isto: era deixar realmente muitos campos que não valem nada, que estão a enganar os seus próprios donos. E disso eu tenho a certeza, que muitos miseráveis, muitos lavradores que eu conheci, de terras onde eu ia e não tinham uma casa caiada, [pausa] tiveram de abandonar tudo. Fizeram até ao último e [vocalização] se não é haver aquele contingente que que foi para a França e para aqui e para acolá, estavam na miséria, não tinham uma casa caiada, não tinham nada. Imagine, por exemplo, [pausa] ali, Penamacor. Eu estive numa pensão que se dizia pagar os impostos e tudo o mais, e não tinha não era [vocalização] um quarto-de-banho, era não tinha nem uma retrete.

INQ2 Imagine.

INF1 Tinha-se de ir a uma bilha, ao lado.

INQ1 E era uma pensão!

INF1 E era uma pensão para pagar imposto! E terras, que eu conheci muitas,

INF2 Sim.

INF1 que não tinham uma casa caiada.

INF2 Sim.

INF1 Hoje vai-se e vê-se: o monte abandonado. Eu conheço muito muito terreno com giestas da minha altura que dava centeio.

INQ1 Exacto.

INF1 E agora está abandonado. E na saída deles, muitos abandonaram, outros puseram as tabuletas e semearam pinhos. E tinha umas tabuletas que era para não meter as ovelhas, dizia: "Tem pinho semeado" aq- aquela gente toda. Hoje vai-se àquelas terras e têm umas casinhas caiadas todas arranjadinhas, o que é não têm ninguém válido: têm crianças e velhos e velhos.

INF2 E velhos. Tantos velhos.

INF1 O resto está tudo a ganhar o dinheiro na França e fora daqui.

INQ2 Pois.

INQ1 O país não aguenta

INF1 vem um ou outro por abaixo que vai parar a Lisboa ou ao Porto .

INQ1 Para ir ganhar miséria.


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