INQ Como é que um rapaz pede uma rapariga em, em casamento?
INF Oh! O meu Emanuel pediu-me em casamento… Foi lá mais o Fabião. Disse aos meus pais que: "Olhe, o [vocalização] Emanuel gosta muito da Ercília e… Este é pedreiro. E é bom tra- É bom rapaz e é trabalhador. E [vocalização] se o senhor, se o senhor Se o tio"… Ele chamava o meu pai tio. "Se o tio lha quiser dar, olhe que ela vai bem, porque ele é muito bom rapaz". E o meu pai disse-lhe: "Isso é com ela. Eu não mando. Quem manda é ela. Ela é que sabe se gosta de dele ou não gosta. Porque se gostar dele, é uma coisa; se não gostar dele, não não vai agora casar à força com ele". E depois o meu pai disse: "Olha, isso é contigo, rapariga". Virou-se para mim: "Isso é contigo. Tu é que sabes se gostas dele ou não". E eu disse-lhe: "Olha que tu tens"… Disse-me ele: "Olha que tu tens o Faustino da Vila da Ponte"… Que namorei cinco anos com ele. "Tens o Faustino da Vila da Ponte e olha que tu, se ele me vem cá inquietar à porta, que me vem cá"… "Ó pai, mas eu não gosto dele. Antes quero este". E E casei com ele. Só namorámos dois meses. Só dois meses. Conhecemos-nos em Junho e em Ago-, em Junho e em Agosto, casámo-nos.
INQ Olhe, e o que é que os pais dão às filhas quando elas se casam?
INF [vocalização] C- Consoante têm os teres. Olhe, a mim não me deram a modo de dizer nada. Deram-me duas mantinhas e e mais nada. Eu é que comprei dois lençoizinhos, e duas almofadinhas – fez-mos a Fernanda –, uma colchinha de vinte e cinco mil réis. Foi o que levei para a minha casa.
INF2 Havia cá muita gente. Gente pobre.
INF1 A minha mãe – éramos muitos e éramos pobrezinhos – deu-me uma mantita maior, melhor, e outra mais ruim. Foi o meu enxoval. Risos E graças a Deus nunca dormi na cama suja. Tinha… Ele adoeceu, passado pouco tempo, teve uma doença muito grande, e eu fiquei grávida da minha filha mais velha. Estávamos os dois doentes. Ia lá uma senhora – a senhora dona Felizarda, que era professora… Coitadinha, tantos anos a acompanhem como de fome me matou! Matou-nos muita fome!
INF2 Ainda tem muitas folhas. Tem que fazer esse livro todo?
INF1 Matou-nos muita fome.
INF2 Oh, oh! Ainda tem muita coisa, não podemos estar a falar. Tem que ser assim.
INF1 E [vocalização] E depois [vocalização] ca- casámo-nos e graças a Deus, olhe, lá fomos indo. Como pobrezinhos sempre, mas sempre limpinhos.
INF2 Então pois…
INF1 Ele Eu tinha aqueles filhinhos, olhe, descalços. Iam para a escola descalcinhos. Mas sempre lavadinhos. Ali a tia Felisberta dizia para a Fernanda: "É uma vergonha, rapariga"!
INF2 [vocalização] Havia muito pobre.
INF1 "Tu que te, a tua tia A tua cunhada faz-te tanta roupinha para os"… Ela tem seis filhos. "E faz-te tanta roupinha boa. E esta Ercília que tem aqui sete de volta dela, trá-los sempre lavadinhos. E tu que tens tanta roupa trá-los sempre uns porcos".
INF2 Eu ainda me lembra que a senhora dona Filipa, a senhora professora…
INF1 Hã? Essa então é que era?!
INF2 Levou uns sapatinhos muito bonitos, dela,
INF1 Pois.
INF2 para dar à criança que lá estivesse, que lhe servissem.
INF1 Pois, mais pobrezinha.
INF2 Sim. Àquela que lhe servissem.
INF1 Pois.
INF2 E ela disse aquilo e eu disse assim: "Ai, se me servissem a mim! Eles são tão lindos"!
INF1 Risos Também os queria!
INF2 Eu era pequena, também lá andava na aula.
INF1 Pois.
INF2 E eu também ia descalça.
INF1 E a Lucília.
INF2 E [vocalização] Digo: "Ai, se me servissem a mim"! A quem serviram? À Etelvina do Faustiniano.
INF1 Ah!
INF2 Que tinha o pé mais pequenino.
INF1 Mais pequenino.
INF2 A senhora Filipa tinha um pé muito pequeninino.
INF1 Pois tinha.
INF2 Só serviram a ela. Todos o calçaram, para experimentar, e só só aquela é que serviu, ficou para ela.
INF1 Ficou… Foram para ela.
INF2 Foram para ela.
INF1 Eram só uns.
INF2 Eram só uns, foi só para ela.