INQ O senhor nunca guardou gado, não?
INF1 Não guardei gado?
INQ Guardou?
INF1 Oh! Era melhor que não não conhecesse isso.
INQ O senhor conhece tudo então!
INF2 Ele tem as profissões quase todas.
INF1 Conheço qualquer coisa, então. Então, eu comecei a a guardar gado, tinha tinha nove anos. Foi logo o meu princípio… [vocalização] Pois, éramos pequenos. Enquanto eu Enquanto era ainda pequeno, porque eu ele éramos muitos… [vocalização] Os meus pais, também por pouca sorte deles também – e eram quase todos naquele tempo, quase todos tinham muitos filhos –, eles arranjaram doze filhos. Doze que, quer dizer, que criaram-se nove e morreram três assim ainda ainda pequenos. Porque morri- E morreu outro. Morreu outro agora já… Foi esse Getúlio, que era logo ao pé de mim, também tinha já aí vinte e dois anos. Ainda se criaram nove. [pausa] Não, criaram-se oito. Parece que eu que não estou enganado. São oito. [vocalização] Se quisesse contá-los, ainda ia contá-los depressa. Quer dizer que agora morreu-me a minha irmã mais velha, Guio- a Guiomar. [pausa] E então, quer dizer, fui… Ele o meu pai, como a gente era ainda pequenos e começaram… Havia um homenzito além em Santa Cruz que [vocalização] até diziam que ele que era assim amaricado e [vocalização] o homenzito, coitado, [vocalização] fazia qualquer coisa que que o mandassem fazer. E depois, depois às vezes, diziam para ele vir apregoar para irem para irem para as escolas ou qualquer coisa que, que que eles lá em Santa Cruz pensassem, mandavam-no, davam-lhe qualquer coisita e o homem vinha. E [vocalização] E veio [vocalização] uma vez cá ao pé da minha casa, ali aquele bocado no ponto mais alto que há ali à casa telhada, lhe chamava a gente, que é um ponto que é mais alto. Botou-se a gritar aí para a para a família ouvir quem tivesse garotos que ele que os mandasse à escola que que era favor, que a professora que tinha mandado pedir para irem à escola e tal – lá em Santa Cruz! [vocalização] A escola era para ali uma casazinha, como era antes que havia, mas, naquele tempo, era a escola que havia lá. Depois fizeram então depois lá… Agora já lá há uma escola. Pois, daí a anos fizeram depois. Mas nesse tempo não havia nada. Era Era uma casinha que ainda lá está mas já é uma casinha já velha. De maneiras que [vocalização] o homem veio lá me apregoar e os meus pais pensaram: "Ah, os gaiatos estão aí" – era eu mais esse irmão mais velho, o Gibelino –, "os gaiatos estão aí, ainda ninguém lhe falou para eles saírem para sítio nenhum, [vocalização] mandá-los também para a escola"! Olha, por por minha pouca sorte ou não sei quê, andei lá cinco dias na escola mais o meu irmão, vieram falar à gente além para as Cortinas, para a gente os ir servir e cuidar cuidar em gado – eu cuidava nas ovelhas e o meu irmão cuidava nos porcos. Viemos para além, estivemos além uma temporada. Depois Depois, ele a lavradora era malina, também má de aturar, e o meu irmão era também um bocado mais reguila do que eu, e então ele lá zaragateou mais ela e depois foi-se embora mas não, não tinha medo de chegar cá a casa e o meu pai guerrear com ele. Andava ali nos arredores, enquanto não esteve mais eu, não descansou. E convenceu-me para me eu me vir embora também e fui também. Deixei-os, não quis lá saber de patrões. Fomos Viemos-se embora os dois e dissemos que eles tinham mandado a gente embora. Pois ele era mentira. Ele, ele é Ele é que tinha guerreado mais ele e ele e ela sempre lhe disse qualquer coisa: "Se quiseres-te ir embora, vai"! Mas ele a mim não… Eles gostavam de mim! Eles não queriam que eu abalasse. E o meu irmão, se calhar… Que ele era assim, mas se acaso ele se amansasse, eles não, pois não não mandavam nenhum embora. Mas o que é certo é que abalámos os dois. Abaláramos os dois mas eles ficaram sempre com pena de mim. E eu, não é lá por me estar a gabar, mas eu, sei lá, parece que tinha assim um feitio que eles, que eles… Era mais mais mansinho, mais mais meigo e eles elas tinham mais coiso por mim. E então fui para lá, mas cheguei lá num dia, no outro dia falaram-me logo para para outro sítio. Nesse Senão então eles vinham-me buscar. Mas fui logo para outro sítio, para onde chamam Outeiro Redondo, que é lá lá ao pé. E sabe o que é que aconteceu depois lá lá nesse Outeiro Redondo? Quer dizer que eu que fui para lá no princípio do Inverno, tinham uma courela – uma, que ele que a gente dá-lhe nome uma courela. Quando não sendo assim uma propriedade grande é uma courela. Além no Monte Novo que é – eu não sei avaliar… De, Dalém de Dali assim de do Outeiro Redondo até lá ao Monte Novo que que lonjura será? É pelo menos aí uns cinco ou seis quilómetros. [pausa] Deve ser. Abalava dali de manhã cedo para ir soltar lá os porcos, com geadões e eu descalço, descalcinho. Olha, eu até [vocalização] não quero mentir, mas eu para mim, que se conhece ainda aqui esta mão, eu larguei a pele das mãos todas. Levava Levava um farnelzinho e eu depois não não podia meter as mãos nas algibeiras para nem … Sei lá! Também era também também maluco! Sempre, se calhar, uma mão, se calhar, sempre podia meter. Mas umas vezes metia uma mão outras vezes e outras vezes outra e ficava sempre uma mão para cuidar do farnelzinho – ainda gaiato pequeno, pois tinha nove anos. [vocalização] Ele o que o que sei é que passei um Inverno mais desgraçado. Chegou-se o fim de do Inverno, eles venderam os porcos, não tinham preciso de mim, fui logo ali para outra casa, logo para o pé, que era [pausa] por conta de da tia Helena, que ainda hoje – essa senhora chamam-lhe a tia Helena –, que ainda hoje é viva. Uma que é mãe dum dum que aparece aí que ainda, que há-dem talvez já talvez que a senhora já tenha ouvido falar nele, um que lhe chamam o Minhoca? Por conta del- Por conta dessa mulher mais desse homem é que eu fui. Bom, esse Minhoca ainda não tinha nascido sequer! Hoje é já um homem já já velho, mas nesse tempo ainda não tinha nascido! [vocalização] Olhe, até me parece que ela que estava em jeitos de ter esse Minhoca quando eu lá estive. Mas não não me recordo bem.