INF1 E já E usava-se xale de ponta pela cabeça! [pausa] Uns xales de ponta! Os xales, a gente fazia uma ponta grande, para ir para trás,
INQ Pois.
INF1 e botava aquilo pela cabeça quando era nos anojados; e anojados, se muito anojados; só aparecia os olhos.
INF2 E às vezes um cachené ainda por riba.
INF1 Hã?
INF2 E às vezes ainda um cachené por riba.
INF1 Sim. [pausa] Mas agora já não se usa isso.
INQ Pois.
INF1 Já é lencinhos na cabeça até no dia dos anojados, é lencinhos na cabeça e passe por lá muito bem. Coitado de quem morre, se ao céu não vai! Aquilo não traz ninguém para cá, mas é um respeito!
INQ Pois claro.
INF1 É um respeito que há às suas famílias. Eu cá um irmão meu morreu, [pausa] o primeiro, usámos nove meses [pausa] xales e cachenés; e ao cabo dos nove meses, fomos de lenço à missa. Mas era xales e um lenço negro na cabeça! E ao cabo de um ano é que tirámos então essa aquelas roupas e… E uns E também irmãos do meu homem têm morrido e eu uso da mesma maneira.
INQ Pois, pois.
INF1 Já não se usa então é xale de ponta! Isso então já não se usa! Mas visto um casaco e boto um lenço preto na cabeça e os primeiros e vou nos anojados é com um cachené [pausa] pela cabeça… É deste feitio. Mas é esta gente mais antiga! Aqueles que são agora não querem, então!
INQ Pois, pois.
INF1 Olhe, e fazem bem. Que a gente com aqueles cachenés, a gente apanha frio, quando chega a casa que os tira, apanha frio, e então anda sempre constipadas.
INQ Pois.
INF1 Mas é a modo um respeito que a gente tem às nossas famílias.
INQ Pois claro.
INF1 Eles não vêm para cá, por a gente usar preto daquela maneira, eles não vêm para cá, mas é aquele respeito que a gente tem às nossas famílias. Sequer um ano, que não é uma coisa que não se ande.
INQ Pois claro. Pois.
INF2 Ai ele!
INF1 Um ano de preto pelas suas famílias, ah senhora, credo! Mas há muita gente já que não quer. [pausa] Já estão como os americanos: [pausa] "Ele morreu, morreu. Olha, está por a conta dos mortos. Morreu, acabou-se"! Mas lá também [vocalização] é assim, não é?
INQ Usa-se também.
INF1 Também usa-se preto lá?
INQ Usa, usa.
INF1 Ah! Lá também. Vês que se usa!
INQ Muito tempo. Muitas vezes, muito tempo. Quando é o marido e isso, eu não sei quantos anos é, mas é… Usam muito tempo.
INF1 É. E na Ribeirinha usavam dois anos, não é?
INF2 É.
INF1 A gente cá aqui usava só um ano. [pausa] E os da Ribeirinha usavam dois anos, preto!
INF2 Mas é que ainda no tempo que eu era rapaz, a gente usava [vocalização] camisa preta – já se sabe –, chapéu preto com um fumo de roda…
INF1 Com uns fumos pretos! E as barbas por fazer!
INF2 E num mês não se metia navalhas…
INF1 Não se metia navalha na cara.
INF2 Hoje é mechinos, mas naquele tempo era navalhas. Na Era [pausa] barbados, [pausa] para aquele tempo. E a gola do da jaqueta virada para cima. Agora eles, morre um irmão, quando é no outro dia, eles estão só em camisa e todos esgargalados para fora e arregaçados…
INF1 E vestem a roupa porque é é um vestir.
INF2 Vai ver
INQ Pois.
INF2 como eles andam para aí.
INF1 Ainda no outro dia vi uma rapariga nova de xale de ponta pela cabeça, na Praia. Não sei se era viúva, se que é. Para mim, ela era daquela banda da Ribeirinha. De xale de ponta pela cabeça!
INQ Pois.
INF1 Que então, coitadinha, [pausa] já custa a segurar.
INQ Pois, pois.
INF1 Não já? Mas ela ia de xale de ponta pela cabeça.