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Melides, excerto 21

LocationMelides (Grândola, Setúbal)
SubjectO oleiro
Informant(s) Galileu
SurveyALEPG
Survey year1980
Interviewer(s)Celeste Augusto
TranscriptionSandra Pereira
RevisionAna Maria Martins
POS annotationSandra Pereira
Syntactic annotationMárcia Bolrinha
LemmatizationDiana Reis

Text: -


[1]
INF E era irmão, !
[2]
Fará se não fosse!
[3]
Risos Tinha medo de eu lhe roubar-lhe o ofício, tirar-lhe o ganho, como o outro dizia.
[4]
INF Não tenho nenhum.
[5]
Tenho raparigas.
[6]
INF tenho raparigas.
[7]
INF Ah, agora !
[8]
Nem um!
[9]
INF Algum quer para aqui vir trabalhar?!
[10]
Eles não querem, não.
[11]
INF [vocalização] O barro que não é trabalhado está em cru.
[12]
Ainda não está amassado.
[13]
INF Mas é barro à mesma, está claro
[14]
[pausa] Isto leva muita volta!
[15]
INF Leva muita volta.
[16]
Isto leva muita volta!
[17]
Isto quando, quando até apanhar uma peça de louça cozida, isto leva mais mais de cinquenta voltas!
[18]
[pausa] Isto leva mais voltas que o pão que a gente come.
[19]
INF Pois.
[20]
INF Se não se fizesse muito, como é que me eu me safava?!
[21]
INF As coisas baratas.
[22]
[pausa] Ainda no outro dia ouvi na televisão também um sujeito que também estava todo muito coiso de estar na televisão a apresentar,
[23]
e depois estavam-lhe a fazer essas perguntas.
[24]
E ele depois disse: "Onde a gente morrendo, a gente que estamos, os velhos, não deve de aparecer mais nenhuns"!
[25]
Esse tipo, [vocalização] estava uma senhora também a fazer-lhe perguntas: "Então e não você não ensina os seus filhos"?
[26]
"Eles?!
[27]
Tenho dois,
[28]
nem sequer [vocalização] aqui para o para o lado da oficina querem vir"!
[29]
E é o mesmo de que os outros todos quantos estão:
[30]
todos têm filhos,
[31]
nenhum aprendeu.
[32]
INF Nem um!
[33]
[pausa] aprendeu foi esse mais velho, que é o que está além do outro lado, que tem tem cinquenta e tal anos.
[34]
Agora essa malta de vinte e tal anos, trinta anos, ah agora !
[35]
O meu irmão Gaspar tinha ali dois filhos tinha e tem, está claro
[36]
um ainda esteve ali mais ele até ir para a tropa [pausa] escolhendo barro, pisando.
[37]
Mexer na roda não, que o pai não lhe dava autorização de ele vir para .
[38]
Senão, depois provava-lhe do petisco,
[39]
mandava o pai pisar o barro
[40]
e ele fazia.
[41]
INF Assim que veio da tropa, oh, tirou logo as cartas,
[42]
o pai: " que agora eu ensino-te".
[43]
"Agora ensina-me?!
[44]
Agora não precisa de me ensinar!
[45]
[pausa] Agora pisa você barro e migue e carregue água"!
[46]
Nunca mais Nunca mais migou barro, nem carregou água, nem nada disso.
[47]
Marimbou-se nisto.
[48]
O outro então O outro então nem sequer ninguém o fez então pisar barro nem migar.
[49]
Abalou para Lisboa
[50]
era moço pequeno,
[51]
assim que fez a quarta classe, [pausa] foi para para empregar-se.
[52]
Depois quando esse, o irmão, foi para a para a tropa, o pai ainda o quis trazer para casa.
[53]
Depois veio estar de licença,
[54]
feze-o pisar barro, uma vez ou duas
[55]
"Anda se pisar barro"!
[56]
A tralha tem porque acabou as férias,
[57]
foi-se pôr ao caminho de Lisboa.
[58]
Está acostumado a não fazer nada,
[59]
vinha trabalhar?
[60]
Agarrar-se a uma enxada?
[61]
Agora!
[62]
Bateu-as!
[63]
Nem sequer quase que aparece
[64]
[pausa] Nunca mais quis saber [vocalização] da olaria do pai, nem gaita.
[65]
INF Agora não se pisa.
[66]
Mas noutro tempo era isto era uma coisa,
[67]
pisar é que dava trabalho.
[68]
[pausa] Isto tinha que ser pisado a pés!

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