VPA16

Vila Praia de Âncora, excerto 16

LocalidadeVila Praia de Âncora (Caminha, Viana do Castelo)
AssuntoOs barcos e a pesca
Informante(s) Aguinaldo

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INF A senhora não, não faz uma ideia não faz uma ideia o quanto me custou aquilo, trabalhar E eu tinha ideias muito avançadas, que eu sempre pedi a Deus para me dar um barco para ir pescar aos Açores, [pausa] de bem novo! E ultimamente, Deus deu-me um barco para ir pescar aos Açores. O meu barco tem dezanove metros, tem tudo quanto faz falta. O meu barco tem uma balsa, cabem dezasseis homens. O meu barco tem um radar. O meu barco tem quatro rádios, quatro rádios. O meu barco tem uma sonda. O meu barco tem uma cozinha. O meu barco tem uma um quarto-de-banho. O meu barco tem tudo. Tudo quanto faz falta. Ainda hoje disse aqui, ao cabo do mar que estava aqui, que eu prefirava não comer, mas tudo quanto fosse de bom para o barco, comprava-o. Não barco nenhum, da Póvoa para o norte, pelo menos, que tenha o bar- tão apetrechado como eu tinha. Tenho um geral-piloto que me custou [pausa] oitocentos e tal contos. Aonde a gente vai ao leme, marcou o rumo e deixa-se ir, vai ali à beira por ir. E Que ele vai sozinho. Mas tinha aquilo tão bem preparado! Deus quis assim. Sete milhões de pesetas são sete mil contos! Ora, atirou com a gente à terra.

INQ Claro

INF Pronto. Então, [pausa] pagámos a multa. Vendemos o barco por oito mil. Que eu dei-o. Eu dei-o. Estava aborrecido nem anunciei no jornal nem nada. Chegou à minha beira um gajo: "Quanto queres? Toma , toma, dou-te tanto". "Pronto, oito mil contos, vai-te embora". Atrás de mim depois eram aos milheiros. Atrás de mim veio aqui gente de Sines, veio de Sesimbra, veio de Peniche . "Está vendido, está vendido, pronto". "Eu dava-lhe doze mil contos". " está vendido, pronto, não quero saber". Fiquei chateado, aborrecido.

INQ Pois.

INF Mas, como lhe digo, custou-me tanto e tanto e tanto que eu não desejo [pausa] ao maior meu inimigo o que custou a mim a pôr-me aquele barco.

INQ Pois, pois

INF Muita lágrima chorei! Eu passei tanto mau tempo no mar, e tanto mau tempo que aqui esta terra, toda ela chorava. Porque andávamos a trabalhar em Matosinhos, [pausa] e eu, como queria fazer das tripas coração, dizia assim: "Agora vou morrer". O barco tinha uma telefonia, que eu falava para a, para a para a minha patroa, para a minha mulher. E eu falava com ela. E ela: "Ai Jesus, anda-te embora, homem"! Eu estava tão longe! Doze horas de viagem! E andava eu aos E ainda havia os peixes! Quando Onde havia era pescada, onde os havia! Ora, aquilo, nem queira saber, muitos dias foi assim. Havia tripulantes que diziam assim: "Eu, [pausa] ia-me embora, que este homem parece [vocalização] um doido, mas aqui é que ganho dinheiro"! Eles chegaram a ganhar quinhentos contos num ano!


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