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Montalvo, excerto 9

LocationMontalvo (Constância, Santarém)
SubjectNão aplicável
Informant(s) Guilherme Guliver
SurveyALEPG
Survey year1991
Interviewer(s)Maria Lobo Ana Paula Banza
TranscriptionSandra Pereira
RevisionMaria Lobo
POS annotationSandra Pereira
Syntactic annotationMárcia Bolrinha
LemmatizationDiana Reis

Text: -

[1]
INF1 Sou o Guilherme.
[2]
INF1 A idade, tenho oitenta e sete anos, feito no dia 2 de Abril.
[3]
INF1 Nasci em 1904.
[4]
INF1 Que eu nasci!
[5]
INF1 Nasci cá, sim senhor.
[6]
Mas tive pouca sorte porque [vocalização], quando a minha mãe morreu, tinha dezoito meses.
[7]
INF1 Fui criado Fui criado com minhas tias.
[8]
INF1 O meu pai andava por fora na na limpeza de sobreiros, e tirar a cortiça, e tudo.
[9]
E fiquei por aqui sozinho.
[10]
INF1 E apanhei uma crise ruim, ruim!
[11]
Olhe que apanhei uma criação ruim!
[12]
Ia à casa das minhas tias pedir um bocadito de pão de milho.
[13]
Pão de milho, que era o que se usava naquele tempo; agora ninguém sabe o que é.
[14]
Se perguntarem o que é pão de milho, não sabem.
[15]
De maneira que ia lá pedir
[16]
e às vezes trazia-o dentro do bolso, porque os outros também tinham fome,
[17]
e batiam-me na mão,
[18]
caía para o chão
[19]
e eu já não o apanhava.
[20]
Depois lá começava a chorar,
[21]
tinha que ir buscar mais.
[22]
Isso é que foi a minha criação!
[23]
Ia apanhar folhas, flores do marmeleiro e ia a meter na boca, a comer as flores, e das roseiras.
[24]
E comer.
[25]
Uma vez apanhei uma flor do do marmeleiro,
[26]
tinha lá uma abelha dentro,
[27]
mordeu-me na língua.
[28]
INF1 Estive Estive em casa duma tia deitado de barriga para o ar
[29]
e ela a espremer-me limão aqui para dentro da boca.
[30]
Aquilo doía que eu cá sei!
[31]
INF1 Eu passei…
[32]
Eu Eu é que sei o que eu passei, com esta idade que tenho,
[33]
é que eu sei o que eu passei, minhas meninas.
[34]
Pois foi!
[35]
INF2 Eu?
[36]
INF2 Setenta e nove.
[37]
INF2 Guliver.

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