MIG03

Ponta Garça, excerto 3

LocalidadePonta Garça (Vila Franca do Campo, Ponta Delgada)
AssuntoO linho, a lã e o tear
Informante(s) Amílcar Aristóbulo Amós

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INQ1 Sim senhor. Olhe, agora, o senhor disse-me que sabia as coisas do linho

INF1 Do linho [pausa] ? Ai, senhor, do linho, haver de de me dizer

INQ1 Dava algum nome ao terreno que estava semeado de linho, ?

INF1 Ele semeava-se Não senhor. Semea

INQ2 Conte como é que era.

INF1 Semeava-se Ele as senhoras co- conhecem a semente do linho, não conhecem?

INQ2 Sim.

INF1 É uma sementinha muito miudinha não é?

INF2 Linhaça.

INF1 É uma linha-. Tratam linhaça, que é a semente que até é muito diz que é muito bom para deitar em vistas quando [vocalização] quando estão inflamadas e que no tempo a gente deitavam. Na nossa casa deitava-se. Se tinha alguma coisa dentro, aquilo no outro dia A gente deitavam um grãozinho daquilo, e aquilo limpava a vista. Tirava tudo para fora. Aquilo semeava-se na terra, um bocadinho de terra daquilo, não é? Aquilo crescia, não é? Então quando estava assim grandinho, aquilo era mondado: [pausa] tirava aquela erva que na- que não era boa para o li- para o linho crescer. As mulheres as raparigas iam mondar aquilo. Nem sequer os homens mondavam mondavam ele. Se tinham tempo, os homens também ajudavam a mondar. Mas quase sempre era as raparigas que trabalhavam nisso. Ele crescia mais um bocadinho, não é? Crescia. Ele o linho era com os rapazes, outra vez, e as raparigas , era tudo amaçado, boleado tudo. É muito bem ele amaçado.

INF3 Fica tudo inchadíssimo.

INF1 Para ele tombar. Para ele ficar tombado, a dormir para ali. Ficava ali. E ele vindo dali é que se põe em outra vez chegava a fim de muito tempo, ele ia-se pondo em , até ele espigar e dar a semente outra vez. Chegava a altura de a semente estar cheia, [pausa] as pessoas arrancavam o linho e [vocalização] traziam-lhe para casa. Havia um ripanço. [pausa] A senhora, eu não sei se sabem o que é um ripanço?!

INQ2 Um coiso daqueles?

INF1 Com uns dentes assim de ferro, sim senhora. Encostavam-lhe Encostavam aquilo num banco.

INF2 Calçavam-lhe uma pedra.

INF1 Calçavam Calçavam duas pedras aqui gran- pesadas para alevantar o banco; calçavam o o ripanço atrás com uma pedra também pesada, não é, e as mulheres ripavam aquilo, [pausa] para ele para a semente cair toda, para ele para tirar a semente, para o ano ter semente outra vez. Depois de o linho estar ripado, o linho é ali estendido em currales de reses que havia muito curral de reses no outro

INF2 Ali vinha um pau descaído.

INF1 Num lugar duro! mesmo quando é na na terra. Num lugar firme! [vocalização] Chão duro! E aquilo estava para ali a secar. Acabava de secar estava ali uma temporada a secar, não é? , acabava de secar, o linho ia para o forno. As mulheres coziam pão e o linho entrava para o forno e coiso. Depois de tirar o pão, e o forno quente, [pausa] aquilo estava tudo em mancheias,, [pausa] para o forno, a secar!

INF2 Iam as mancheias.

INF1 Acabava [vocalização] de secar bem quando ele estava bem seco havia aqui nesta casa do meu sobrinho, que é aqui nessa entrada dessa canada , havia ali um umas pedras de mármore [pausa] que era de amaçar o linho.

INF2 Com ajuda

INF1 As mulheres todas ali, que ele aquilo é: estava sempre a pedir-se. Quando o linho acabava, entrava outro.

INF2 À peaça.

INF1 A casa da minha madrinha tinha um celeiro. Era o lugar de onde amaçava o linho.

INQ2 Com quê?

INF1 Com uma maça. Com uma maça de madeira. Ainda te- Ainda tenho uma em casa também. As mulheres a- ele amaçavam aquilo muito bem amaçado. Acabavam de amaçar o linho, o linho entrava outra vez para o forno. Ia outra vez ao forno e do forno ia para as pastagens. Se- [vocalização] Estendiam nas pastagens [pausa] depois de o pasto est-, ta- estar comido. Ele não é com a erva grande! É quando ele as vacas acabavam de comer o pasto, as mulheres pediam aos lavradores: "Eh, meu tio, podes-me deixar estender linho no teu pasto"? e assim, e assim. Ele deixava. Estendiam aquilo tudo. Havia temporadas de vento que, às vezes, enrolava aquilo tudo para os combros, para as barreiras. Ele larga-as. Era a dizer a elas: "O linho que está por , vocês vão ver o linho, que aquilo está ali tudo de lapa". Andavam as pobrezinhas a juntar aquilo outra vez para deitar aquilo tudo. Quando a erva pegava bem no linho [pausa] é que o vento nunca mais levantava ele.

INQ2 Pois.

INF1 Aquilo estava ali uns tempos outra vez, imenso, e traziam o linho para baixo. Ala! Ele Ele o linho para baixo outra vez para as [pausa] Havia três mulheres que trabalhavam o linho, que era [pausa] gramar o linho.

INF2 O linho.

INF1 Com uma gramadeira, gramar o linho! Depois de o linho gramado, ia para o para as costas de uma cadeira [pausa] para a tasquinha, para tasquinhar o linho.

INQ2 Que era para tirar o quê?

INF1 [vocalização] Para pôr o linho fine!

INF2 Pois, o linho fine.

INF1 A tasquinha é que tirava aquela folhada toda do linho. Aquilo tudo que não prestava caía fora. E ficava aqueles cabelos f- aqueles cabelos fininhos, muito fininhos, bem tasquinhado. [vocalização] A mulher estava nas costas da cadeira, com uma tasquinha que é como uma espada, tudo em madeira! ,

INQ2 Pois.

INF1 sempre a dar ali. Davam! Viravam aquilo para um lado e para o oitro Tasquinhavam aquilo muito bem tasquinhado. Depois de tudo bem tasq-, tasq- [vocalização]

INQ2 Tasquinhado.

INF1 tasquinhado, ia para os teares para [vocalização] Ah! Havia

INF2 Ele havia uma roca.

INF1 ainda havia uma roca!

INF2 As mulheres que fiavam

INF1 As mulheres que fiavam [pausa] com a com saliva da boca e estavam com a roca fiando com o fuso! Enrolavam aquilo; quando aquilo estava em fio

INF2 A fazer linha. Para fazer linha.

INF1 A fazer linha [vocalização] é que aquilo ia fazer obra.

INQ2 Sim senhora. Grande explicação!

INF1 É. O tempo do linho é esse, que eu que me lembre.


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