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PST19

Camacha, excerto 19

LocationCamacha (Porto Santo, Funchal)
SubjectA alimentação
Informant(s) Acidália
SurveyALEPG
Survey year1994
Interviewer(s)Gabriela Vitorino Luísa Segura da Cruz
TranscriptionSandra Pereira
RevisionAna Maria martins
POS annotationSandra Pereira
Syntactic annotationCatarina Magro
LemmatizationDiana Reis

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INF [vocalização] se sabe, chegava-se [vocalização], matava-se se matasse a gente [vocalização] matasse o porco no Natal, se sabe, chegando [vocalização], depois da morte do porco, no outro dia faziam aqueles pedaços de carne para deitar alho e vinagre e loiro e tudo e ficava ali numa vasilha a conservar até dia de festa. No dia de festa, minha mãe [vocalização] levantava-se, partia [pausa] pão aos pedaços e fritava a carne e depois molhava aquele pão, para a gente comer, junto com a carne.

INQ1 Isso era no dia da festa?

INF No dia da fe- do Natal. Na parte da tarde, minha mãe era [vocalização] galinhas de casa; se sabe que era aqueles galos grandes, tirava ali um, um um quarto ou dois que a gente diz um quarto, que faz-se uma ave em quatro quartos , minha mãe cozia metade, ou cozia três quartos, conforme, ou cozia um inteiro, conforme [vocalização] a família que tinha em casa [pausa] e, se sabe, era [vocalização] deitava a cozer [vocalização] e depois deitava-lhe massa, desta, que da [vocalização] mercearia. E eu me lembra um ano [pausa] que meu pai acho que como a minha mãe não tinha dinheiro, [pausa] a minha mãe amassou desta farinha de trigo da terra, bem amassadinha fazia umas tiras com [vocalização] uma garrafa e minha mãe cortava assim, tudo direitinho, tudo direitinho, aquilo ficava tudo fininho, tudo fininho e [vocalização] minha mãe deitava na panela e a gente comia por massa.

INQ1 Ah!

INF Era assim. Lembra-me minha mãe fazer um ano, para o primeiro do ano Minha mãe, acho que não tinha dinheiro, coitadinha. Praticamente, se minha mãe não tinha, não me disse, mas eu [vocalização] eu é que pensei que não havia. E minha mãe depois, na peneira de peneirar a farinha, minha mãe pôs assim na a casa era mais baixinha , pôs assim na beira, estava um lindo sol, para tostar aquela massinha. Pensa que ela não ficava gostosa? Havia lentilhas [pausa] Minha mãe às vezes fazia, mesmo para outros jantares, minha mãe fazia. Cozia a lentilha adiante, depois deitava a massinha, um pedacinho de [vocalização] ou a banha de porco ou a [vocalização] ou não sei se [vocalização] . Óleo não havia nessa altura, não havia [vocalização] [pausa] óleo. Mesmo que houvesse, [pausa] se [vocalização] se havia era bem pouco. Era mais [vocalização] qualquer coisa de azeite de que o óleo próprio. O ó- O óleo [vocalização] veio por último que o azeite. E comia-se o nosso pratinho de massa com lentilhas, às vezes com abóbora, desta abóbora que meu pai lidava numa fazenda, fazia [vocalização] semeava. Dava chuva, graças a Deus, [vocalização] punha terra a descampar, metia [vocalização] umas sementes aqui, outras acolá e dava abóbora. Até lembra-me um ano de meu pai ter cabaças. Umas cabacinhas de limpar o comer por dentro e [vocalização] e depois fazer uma vasilhinha da água .

INQ1 Pois.

INF Sim Senhoras. E eu ia a essa fazenda mais meu pai. E era assim a nossa vida. Depois, se sabe, foi [pausa] foi melhorando qualquer coisa, foi melhorando qualquer coisa se sabe, minha mãe cozia um pedacinho de arroz [pausa] para se comer depois de [vocalização] comer o caldinho da massa. Mas minha mãe deitava-lhe desta deitava-lhe abóbora, que ficava um arrozinho tão amarelinho que parecia uma gema de ovo!

INQ1 Ai, que giro!

INF E gostoso! Mas era dumas abóboras de casca branca, aqui de Porto Santo. Era u

INQ1 Mas não essas abóboras?

INF Ainda .

INQ1 Ah, ainda .

INF Ainda , mas a chuva é pouca e está acabando com tudo e ninguém quer [vocalização]. Eles, quando semeiam as melancias no Verão, é que metem nos cabos da [vocalização] das mantas, [pausa] que tiram para as melancias, é que põem uma aqui, outra acolá. Porque aquilo [vocalização] é uma deita uma rama muito grande e, quando a melancia está co-, aquilo vem para cima da melancia. Então, eles prantam umas sementes aqui, outras aqui. E [vocalização], mas este ano houve menos porque não houve chuva.

INQ1 Pois é. Isso é preciso muita água.

INF Tenho uma filhaTenho uma filha casada em baixo defronte do aeroporto, que até o meu genro trabalha na Câmara de Porto Santo, que é chofer. E ele gosta muito da verdura, de verdura. E tem um colega que [vocalização] Mais ele . Mas acartaram, este ano, acartaram água, acartaram água, da serra de dentro, dumas represas, acartaram, acartaram. Eles semearam melancias algumas quatro ou cinco vezes, para o resto ainda tiveram umas perinhas, mas depois quando um tem, tantos têm. Quando para um, para todos.

INQ1 Claro.

INQ2 Pois.

INF Depois vendem aquilo mais barato, olhe É, mas é melhor haver e tudo ter de que [vocalização] O nome de haver é lindo! Que eu, se eu não tenho e a senhora tem, oferece-me uma melancia. Se a senhora tem [vocalização] peros ou laranjas, oferece-me E é assim. Quando não é que é pior para todos.

INQ1 Claro.

INF Sim senhora. E que acaso então, graças a Deus, foi o que Nosso Senhor não me deu [pausa] foi [pausa] ser falsa, [pausa] mentirosa, [pausa] amiga de sacrilégios, [pausa] graças a Deus. Tenho o que Nosso Senhor me depare, ouço dizer que os outros que têm, por exemplo, posso ouvir dizer: "Olha, aqui à parte de cima está uma festa, uns noivos ou qualquer coisa". Não me abalo. Se eu ouvir dizer: "Olha, fulano pisou-se, ou ele morreu morreu, ou coisa", isso eu tenho mais pena. Mas graças a Deus, eu não{fp estou aqui na minha casa à conta de Deus, a minha nora, às vezes, vem para baixo comigo. E tenho ali uma vizinha ao lado, que às vezes também vou um pedacinho e assim se vai passando à conta de Deus, que não melhor coisa que é [vocalização] que é quem quem é assim, à conta de Deus.

INQ1 Pois! Ah, claro.

INQ2 Claro.

INF Mesmo que tenha um sítio, fiquei num lugar que ninguém me .

INQ1 Ficou mesmo na ponta da, da terra.

INF Fiquei mesmo aqui à conta de Deus. Casei-me, vim para a minha casa à conta de Deus [pausa] e aqui tenho estado. lhe deu a formiga-branca, o meu marido deitou uma lajem

INQ1 Ah! A formiga-branca, para aqui, não é?

INF É, minha querida, tiraram-me portas e tu- tirámos portas e tudo!

INQ2 Ai! Que horror!

INF Sim senhora!

INQ É muito mau.

INQ2 Pois é!

INF Fui à Câm, a Câmara Eu pedi à [vocalização] uma ajudazinha à Câmara. A Câmara não me deu grande quantidade mas deu-me, graças a Deus, que me [vocalização] serviu bastante.

INQ1 Pois.

INQ2 Pois é.

INQ1 Sim senhor.

INF Se formiga-branca neste Porto Santo! A gente sentia ela roer. A gente sentia elas roer. A esta porta deste lado, a parte esquerda, eu nem lha podia abrir, porque se eu lha abrisse, ela ia trazer o aro consigo. Porque o aro estava com aquela casquinha! Quem lha forcejasse para ela abrir lha abrir ou para ela fechar lha fechar, ela ia vir sempre. [vocalização] M- Missagras iam ia desapegar aquele pedaço do aro e ia vir sempre. Deu um trabalhão e [vocalização] ainda se ficou devendo [vocalização] [pausa] a tanta gente mas, agora, graças a Deus, pagámos.


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