INF Isto está aqui uma coisa… Há uma coisa… Isto é engraçado. [vocalização] Noutro tempo, havia muito divertimento – no tempo da miséria, quando havia miséria – e o pessoal entretinha-se entretinha-se. Aqueles que tinham muito, tinham automóveis, tinham isto, tinham aquilo e tal, tal, tal. Aquele pequeno nunca pensou – com licença – em possuir um automóvel, em possuir uma biciclete a motor, e coisa. E então tinha que ir para coisas lá que lhe pertenciam. E então qual eram as coisas que pertenciam? [vocalização] "Ah, eu vou para uma taberna, cantar uma modinha". [vocalização] Lá mandava assar um bocadinho de linguiça e comê-la [vocalização]. Não tinha aquela coisa e tal, tal. Hoje não existe já isso. Já não existe isso. Uma pessoa numa terra destas… Por exemplo, aí à rés duma estrada, aparece um restaurante. Então aparece um freguês de Lisboa, depois ao fim de um bocado aparece um do Algarve, passou no carro, e tal, tal, tal, tal e a taberna ali [vocalização] faz uma comida, faz uma coisa, e tal. E essa taberna tem uma saída. Aqui, nestes sítios, já não acontece isto. E não acontece isto porquê? Porque é já rara a pessoa, mesmo numa terra destas, que não possua já um automóvel. E essa gente hoje que possui já automóvel, já querem estar numa classe, já não querem saber da taberna. [pausa] Vão mais depressa, por exemplo, passear aqui ou além, e vão comer depois lá a um restaurante desses. E vem o domingo, que eram os dias em que a gente fazia qualquer coisa numa taberna destas, um domingo que se aproveitava, pois é nos domingos que é os dias mais ruins numa taberna, numa aldeia. Porque aos domingos, toda a gente tem automóvel e aquele que não tem vem dalém o vizinho… Mas os automóveis são já muitos e os vizinhos são também muitos, e quando a gente dá-se notícia, ao domingo é um silêncio!… Se a gente estiver deitados até um bocadinho mais tarde, não se ouve rumor de nada. Parece a gente que está no monte. Aos domingos! Aos sábados e aos domingos parece a gente que está num monte! Não se ouve ninguém! A gente abre uma porta para vender um copo de vinho, essa coisa, pois marchou-se tudo: um foi para a praia, outro foi para uma ribeira aí comer um petisco, outro foi para outro lado. Têm automóveis! Têm os carrinhos para a coisa e tal, tal. E em vindo outro certo tempo, têm os carrinhos, aos domingos vão à caça, coisa e tal, tal. E os domingos numa terra destas – sábados e domingos – são sempre mais ruins. E depois aos dias de semana vão trabalhar e pronto, aparecem… É sempre uma moenga. E essas casas que estão aí perto da estrada nova são os uns restaurantes que, em tendo uma casa bem arranjada, defendem-se bem. Defendem-se. E um tipo aqui numa terra destas não se defende com uma taberna. Não se defende com uma taberna porque aos domingos – que é o dia em que a gente fazia, no outro tempo, dinheiro –, ninguém tinha automóvel, vinham para uma taberna, cantavam, e [vocalização] pulavam, e [vocalização] isto, e aquilo, e tal e estava tudo muito bem. Agora não! Agora têm automóvel, querem lá saber agora de estar aqui em Montes Velhos, em vindo o domingo! Marimbam-se em Montes Velhos e vão-se embora. Vai-se tudo embora. Ninguém quer estar aqui.