INQ Olhe, aqui não havia antigamente, o senhor já não, não deve ser do seu tempo, que havia terras que pertenciam a toda, pertenciam, eram de todos?
INF Para aqui na nossa zona, [vocalização] aqui na nossa zona… Pois, foi muito antigo. Isso Essas coisas aqui na nossa zona, foi muito antigo, está a perceber? Foi muito antigo. Apareciam aqueles ministros, nesse tempo, [vocalização] com mais vista, mais engatunados, olhavam e faziam. Aqui à frente havia aqui uma há aqui uma propriedade que é a Alagoa. Está aqui uma propriedade que é a Alagoa. E havia aqui um macaco, que era o senhor que é Hipócrates Honório.
INQ Sim.
INF Um gajo rico. Ah, mas é um gatuno de marca! Era um gatuno de marca, esse Hipócrates Honório. E não tinha filhos, nem nada, o bicho. Não tinha filhos. Até unicamente enganou aí uma mulher e [vocalização] pegou no moço, que mandou um criado pôr o moço em Messejana, esse esse macaco. Mandou pôr o moço em Messejana. Uma filha! Uma filha. E mandou pôr a filha em Messejana. Pois, nesse tempo havia os tais que lhe chamavam a isso enjeitados. Punham Iam pôr os moços à porta das pessoas. Puseram lá a mocinha. A mocinha à porta duma pessoa, a pessoa estava do lado de dentro, ouviu chorar, e quando se levantou estava uma moça dentro duma alcofa, lá à porta. Depois levou a moça lá para casa e tratou da mocita e tal, tal, tal. E mais tarde, ele sempre lhe deu assim consciência e mandou-a buscar. Não foi o coiso, foi mais tarde. Foi a mãe aqui do Homero.
INQ Rhum.
INF Uma senhora que tem aqui uma drogaria, ali onde vocês estiveram esta manhã, aqui no largo.
INQ Rhum-rhum.
INF A mãe A mãe desse rapaz [vocalização] era filha desse Hipócrates Honório, uma criada que ele tinha em casa e enganou-a e [vocalização] então depois fez esse trabalho. [pausa] Mas esse gajo tinha ali a Alagoa. Era um grande pirata! [pausa] Pegava lá num criado e tal, tal, tal, tal, e pois aquilo eram umas charnecas – havia ali umas charnecas –, pouco ligavam ao terreno; noutro dia, pegava nos marcos, ia mudando neles. Foi mudando neles, foi mudando neles – ah, filho dum cabrão! –, mudou ali da Alagoa para uma propriedade, que é a Boiadeira. [pausa] Mudou ali aquilo quase tudo com uns marquinhos lá à vontade dele. E depois mais tarde foi andando com os marquinhos, apanhou a Senceira – uma propriedade que é a Senceira. E ninguém queria saber também daquilo, fez lá um monte e arranjou lá aquela coisa toda e pôs-lhe lá o monte da Senceira. E depois foi indo, foi indo, o gajo chegava a [vocalização] Sines, com aquela brincadeira, o cabrão. Risos Daqui de ao pé de Montes Velhos chegava a Sines. Abalou, abalou, o pirata, ele abalou coisa [vocalização]… Aqui era a Alagoa, e apanhou a Boiadeira e apanhou a Senceira. Mas lá pegado com a Senceira há um monte que é o Manguelho. E E estava lá gente já morando nesse monte. Que o lavrador Honorato, ainda conheci esse homem… Era o lavrador Honorato, que ainda conheci. Aquele Hipócrates Honório não tenho ideia mas o outro conheci lá, o lavrador Honorato. E esse um dia foi dar com os marcos da Senceira já lá quase todos dentro do Manguelho. Oh, o gajo ia indo, chegava ao mar! O bicho era um pirata da primeira apanha! Chegava, coiso e tal, e era daqueles gajos [vocalização] da justiça, de coisa e tal, e ninguém lhe dizia nada. Ia para aí indo e pronto. Ah, mas lá o Honorato do Manguelho – que eu conheci ainda bem – foi dar com os marcos e foi logo lá caminho do monte. Foi lá caminho da Senceira, foi dar com o feitor: "Afinal, aqueles marcos estão já lá tão longe, que jeito tem aquilo, e tal. Ah, por acaso eu já os colhi. E [vocalização] eu não me importa de eles serem lá postos. Mas tem que ser o seu patrão. [pausa] Não é você que os vai lá tanchar. O seu patrão é que os vai lá tanchar. E eu deixo já aqui dito para o seu patrão estar lá tal dia de manhã, que eu estou lá de manhã, que é para a gente tanchar os marcos". Mas ao outro dia, com uma espingarda às costas, e ia contando se ele fosse lá para deixar os marcos, matava-o lá. Deixava-o lá morto. E ele achou que o negócio para ali para aquele lado que não foi assim muito bom e então o outro pegou nos marcos, vieram-lhos tanchar cá no lugar da Senceira e lá para o lado do Manguelho já não foi. Foi quem o segurou, senão o cabrão ia parar ao mar! Risos Só, só o mar é que Só o mar é que segurava o bicho. Só o mar é que segurava o bicho. Mais tarde acabou por morrer… Sabe o que é que o pirata dum cabrão ainda fez? Acabou por morrer e a família, os outros Honórios… Aquilo era uma família que era Hipócrates Honório. E havia uns lá na Peroguarda… Se vocês falarem lá na Peroguarda, eles ainda há lá, muitos Honórios.
INQ Já ouvi falar. Já ouvi falar dessa família.
INF Há lá uns Honórios dessa da raça desse bicho. [pausa] Esta dita filha casou e o marido, [vocalização] um parvalhão qualquer e [vocalização] a querer tudo e também, guloso, mas guloso mas daqueles gulosos parvos, de lhe darem qualquer coisa… O Hipócrates Honório morre e ela, como filha – toda a gente sabia; pois estava ainda aí o feitor, esse que a tinha levado dentro duma alcofa para Messejana! –, sabendo que ela que era filha dele e estando ainda aí o homem e essa coisa toda, havia alguém que lhe tirasse aquela fortuna? Ninguém! O que é que o cabrão faz? Quando morreu, deixou tudo para os sobrinhos! Só tinha sobrinhos, não tinha filhos! Tinha aquela filha, mas chegou-se para trás, que não tinha filhos, que não tinha filhos, e deixa tudo aos sobrinhos. Os sobrinhos muito macacos chamaram o marido dessa senhora e disseram-lhe e coisa… Depois toda a gente dizia: "Vai coiso homem! Vai coiso, que vais mamar aquilo. Vai caminho de Beja! Vai caminho dum advogado que aquilo é tudo teu, a Alagoa e a Senceira e a Boiadeira, isso é tudo teu, homem! Isso é tudo teu, homem! Então Então se a tua mulher é que é a filha dá agora"! Com os sobrinhos não se m- Mas os outros todos ministros ainda – e moravam aqui uns –, o que é que fizeram a esse gajo, o marido dela? Chamaram-no: "Então que conversa é essa? Deixa-te lá disso, homem! Toma lá vinte mil reizitos e vai coiso". Ele gostava muito duns copinhos, ia beber vinte mil reizinhos de vinho. No outro dia: "Espera lá, vai lá aqui a casa, toma lá um alqueire de farinha". Foram-no contentando com essas merdas, filho dum cabrão deixou passar aquela merda toda, não apanhou nada. Não apanhou nada.
INQ Pois.
INF Davam-lhe um Deram-lhe um alqueire de farinha, deram-lhe uns vinte mil réis. Era o pai do Homero, guloso!
INQ Pois.
INF Guloso! Vinte mil reizinhos. "Toma lá cinco, toma dez". Lá os da Peroguarda e os outros mamaram a Alagoa, mamaram a Senceira, mamaram isso tudo. Tudo gajos ali que não tinham falta nenhuma daquilo. E este, parvalhão, não apanharam nada. Não apanharam nada.