INF Porque eu sou natural de Cabeço de Vide [pausa] mas o meu pai era natural de Pedroso [pausa] e a minha mãe era natural da Beira. [pausa] Está a perceber? E então, quer dizer, isto é tudo enxertias.
INQ1 É tudo enxertias.
INF E então, quer dizer, tenho lidado [pausa] com várias pessoas: umas duma maneira, outras doutra; umas com um pensar, outras com outro pensar… [vocalização] Eu sou um … E eu gosto de conversar e de me entender com toda a gente porque não há nada mais bonito [pausa] que é a boa união.
INQ1 Exactamente.
INF Não há nada que chegue a isso. Nada! A boa união [vocalização] faz tanta falta como a saúde.
INQ2 É, é mesmo.
INF A saúde é a parte principal que faz falta, porque, se a pessoa não tiver saúde, não tem alegria, não tem nada. Tudo se estraga. [vocalização] E o fulano também se estiver metido [vocalização] inimigado com esta pessoa, com aquela, com a outra, com a outra [vocalização], às duas por três, passa por uma data de gente, isso já é tudo inimigos não, ninguém. Ninguém quer falar. E então, não há nada mais prático que é a boa união. Eu, uma ocasião, [pausa] enganaram-me. Fui daqui a Portalegre, [pausa] procurando por um especialista de ossos. [vocalização] E a informadora – era uma pessoa que estava a passar [vocalização] bilhetes para para ir a este médico, ou para ir àquele – e diz-me assim: "Só Só indo aqui ao ao Doutor Balcão". [pausa] "Então mas como é que se ele chama? É Doutor Balcão"? "É Doutor Balcão. O senhor tem de trazer uma credencial". Eu vim cá, pedi uma credencial ao doutor, cá – que é essa estátua a que está ali no largo. E diz-me ele assim para mim: "Ó rapaz! Eu já há muito tempo que não caminho lá para o lado de Portalegre, mas parece-me que tu que estás enganado. [pausa] Não conheço lá nenhum Doutor Balcão". Mas eu tinha confirmado que ela que me tinha falado em Doutor Balcão. Eu digo: "Ó Senhor Doutor, eu… Falaram-me em Doutor Balcão". "Está bem. A gente passa a credencial". Cheguei lá apresentei a credencial à pessoa. A pessoa esteve a ler aquilo e diz-me assim para mim: "Então donde é que você é"? "Sou de Cabeço de Vide". "Os de Cabeço de Vide estão para lá a dormir"? E digo eu assim para ela: "Então porquê"? [pausa] "Então, vem aqui Doutor Balcão. Então há aqui algum Doutor Balcão"? [pausa] E eu faço aqui assim: "Então, donde é que a senhora é"? "Eu sou de Portalegre". "Então, olhe, eu não sei os quais é que estão a dormir, se são os de Portalegre, se são os de Cabeço de Vide. Até me parece que é os de Portalegre. Tal dia assim assim, estive eu aqui e foi você que me informou para o Doutor Balcão". [pausa] Mas eu fiquei esmarafado, [pausa] ia-me embora. Vai uma senhora qualquer, agarra-me aqui assim por um braço: "Onde é que você vai"? "Vou-me já embora". "Não, não vai-se embora. Você peça lá à bilheteira e ela tem que lhe arranjar a consulta. Ela é que lhe deu cabo da consulta a você e ela é que tem que lha fazer". . [pausa] Eu digo: "Então, está bem"! Volto para lá. [pausa] Quando, a, aqu- Aquilo era bichas! Quando chegou à Quando cheguei lá outra vez e diz ela: "Então o que é que você quer"? "Quero que você me arranje a consulta. Você é que ma estragou". [pausa] "Espere um bocadinho". O número três.
INQ2 Ora vê.
INF Mas se não é a outra mulher, eu vinha-me embora. Estava lá um homenzinho, que era aqui de Santo Amaro, o homem deu por aquilo tudo. Mas a consulta só era às três horas. Venho cá para baixo, assento-me ali num banco. [pausa] Estava o homenzinho, estava assentado além num banco, e eu fui, passei pela banda, fui-me assentar lá noutro banco, lá mais abaixo. Depois de estar assentado, o homem levanta-se lá 'daonde' estava [pausa] e foi-se sentar lá ao pé de mim. E diz-me assim para mim: "Ouça lá, então o senhor [pausa] já se desentalou"? [pausa] Eu [pausa] parece que nunca tinha-o visto mais gordo, digo assim: "Então já me desentalei de quê? Diga lá". "Então não era você que estava à rasca ali, que não tinha consulta"? "Ai, eu já, já mas eu já arranjei consulta". Disse eu para o homem: "Eu já arranjei consulta". E o homem faz-me assim para mim: "Você já se arranjou. Só eu é que me calha tão mal e não sou capaz de me arranjar". Digo eu assim: "Então, mas o que é que você queria? O que é que você vinha à procura"? "Ora, o que eu vinha à procura era tirar um dente mas cheguei ali já passaram as senhas todas. Venho de Santo Amaro para aqui, estou lá num monte, custaram caro a arranjar outra pessoa para ficar lá no meu lugar, agora chego aqui… Paguei o transporte para cá, vou pagar o transporte para lá e não e não tiro o dente. E ando à rasca com o dente, c- com dores de dente". Digo assim: "Então você estava disposto a, a arranc- a [vocalização] pagar a tiragem dum dente"? "Eu estava, sim senhor. Assim arranjasse uma pessoa"… Digo eu assim: "Venha comigo num instante". [vocalização] Eu olhei para o relógio, vi que aquilo… "Já está mesmo, com certeza, na hora de ele fechar a porta. Marche"! Chego ao fundo da escada, bati, chega uma senhora lá ao cimo da escada e diz aqui assim: "Já parou a consulta". E eu faço a queixa: "Ó minha senhora, eu não venho para ser consultado. Eu venho para pagar uma dívida ao Senhor Doutor".
INQ2 Ha, ha, ha!
INF [pausa] Não, mas é que era de verdade que eu devia.
INQ2 Ah!
INF Devia o arranjo de uma uma placa. [vocalização] "Então suba". Mas eu pus assim as mãos detrás das costas e fiz assim ao outro.
INQ2 Para ir atrás de si.
INF E o outro subiu [pausa] escada ac- coiso. Que eu tinha confiança com o médico!
INQ2 Pois claro.
INF [vocalização] Entrei para dentro e digo: "Ó Senhor Doutor, desculpe de eu não ter pago há mais tempo, mas eu vim aqui em tal tempo assim assim e o senhor não estava cá. Entrei além em casa do seu vizinho e ele procurou-me se eu sabia quanto é que era a conta que eu devia, que podia deixar lá o dinheiro, q-, que o senhor doutor, que que era entregue o dinheiro. Mas o Senhor Doutor não me disse quanto é que era que eu tinha a pagar. E então, olhe, eu não deixei o dinheiro porque eu não sabia quanto é que tinha a pagar. Agora venho procurar ao Senhor Doutor quanto é que eu tenho a pagar". E e- E o homem faz-me assim para mim: "Olhe, só pela sua prontidão, não é nada". [pausa] "Ó Senhor Doutor, veja lá se fica mal". "Não, não fico mal". "Ó Senhor Doutor, mas eu queria-o incomodar noutra coisa". "Diga lá o que é". "Está aqui uma pessoa assim assim, que foi lá ao coiso p- e já gastaram as senhas todas. O homem está à rasca com uma dor de dentes. O Senhor Doutor não fazia o favor, mesmo pagando – que o homem pagava –, tirava-lhe o dente"? "Diga lá ao homem que eu tiro". [pausa] Oh! O homem [vocalização] estava aí atrás de mim, digo eu assim: "Vá, entre". O homem entrou, tirou-lhe o dente. "Então, quanto é"? "Não é nada".
INQ2 Esse ganhou o dia.
INF Depois eu marchei pela Rua do Comércio abaixo e o homem atrás de mim a falar sozinho. O homem a dizer assim: "Mas então, eu não conheço o homem de lado nenhum [pausa] e agora o homem faz-me um trabalho destes?! Mas então o que seria isto? Isto seria algum milagre de Deus"? O homem a falar sozinho! Chega cá em baixo, cá de perto da árvore e diz-me ele assim: "Vamos ali beber um copo". Digo: "Olhe, eu acabei de beber agora. Vá lá vomecê beber o copo. Ouça lá, você está contente ou não está contente"? "Estou, sim senhora". "Eu também estou contente à mesma. Pronto"!