INQ1 Até se chegar a ter uma linguiça, o que é que é preciso fazer?
INF1 Sim. O que é que é preciso fazer? Pois, a gente, se- mata-se o porco. Divide-se já… [pausa] A carne que é para a linguiça, [pausa] já a retalham… Há- Há pessoas, hoje em dia, que já a picam no mesmo dia. Mas disso eu não gosto – está percebendo? –, no mesmo dia. [vocalização] A carne é retalhada já assim, quer dizer, que fica só presa. Mas a da linguiça já se põe de parte para se fazer a vinhada. Faz-se a vinhada, de- deita-se uma percentagem de água: aí uns dez litros de água para um quilo de sal. Isso é o que eu faço…
INF2 Ah, é a carne do porco, a da vinha-de-alhos.
INF1 É, é. Que a senhora agora quer saber isso da linguiça. E [vocalização] esses dez litros de água para um quilo de sal. Se são vinte litros de água, pois são dois quilos de sal. Mas sempre a gente deita mais uma coisinha, quem quer. O meu gosta sempre dela mais uma coisinha salgada, pois já se sabe que ela tem melhor sabor e para não se estragar. E deita-se numa numas selhas grandes. Numas selhas desses barriles [vocalização] de
INQ2 De vinho.
INF1 de vinho. [vocalização] Divididos ao meio dá duas – está percebendo? –, que é melhor depois de a gente mexer. E põe-se ali o alho, o sal; deita-se pode-se deitar também adubos, cominhos e jamaica, que dá muito gosto à [pausa] à vinhada.
INQ1 Tudo pisadinho, não?
INF1 Sim, tudo pisadinho. Os alhos também pisadinhos. Os que a gente lhe parece! Também não precisa agora de muitos! E [vocalização] E ali bota-se a [pausa] a carne.
INQ1 Jamaica. Isso era um segredo.
INF1 [vocalização] Bota-se a carne ali, naquela água, a ela ficar não ficar muito encostada – não sabe? –, [vocalização] a ficar [vocalização] a se poder mexer bem. Ali fica a água, dois ou três dias. Há pessoas que matam hoje e como a depois de amanhã já fazem. Mas a gente gosta de estar mais um dia ou coisa assim. Depois, tira-se a carne para fora – a carne já está adubada! –, tira-se a carne para fora e [vocalização] e deita-se a escorrer. Pica-se então… J- Já está aquelas tirinhas – não sabe? – que se fez [pausa] já ao jeito de se picar.
INF2 São bocadinhos assim.
INF1 Bocadinhos, quanto mais miudinhos, melhor. A gente [vocalização], depois de ela toda picada, torna-se a juntar toda [pausa] ali. Ainda se caldeia mais uma coisinha de adubos, para aquela que teve o traço, que não teve adubos, ficar toda bem adubadinha e e está pronto a encher. As tripas do porco, então, as que são da linguiça são mais estreitas. Que a gente também faz morcela! Mas não quer saber agora da morcela, é da linguiça, não é?
INQ2 Primeiro é da linguiça.
INF1 Sim. [vocalização] Depois, então… Antigamente, não havia máquinas de fazer linguiça – está percebendo? –, mas hoje já há.
INQ2 Não, mas antigamente como é que era?
INF2 [vocalização] Era nuns funiles.
INF1 É. Quer saber é antigamente. Era uns funiles [vocalização] que se metia a, a a ponta da… [pausa] Aquilo era a- assim [pausa] como um canudo [pausa] mas largo por cima. E metia-se aquele canudo na tripa. E lá se dia tirando da carne e botando aí. Levava muito tempo [pausa] para se fazer a linguiça, passando pela linguiça toda! E enchia-se a linguiça e depois…
INQ2 Toda inteira?
INF1 Toda intei-. Toda inteira não! [vocalização] Escute!
INF2 Aos quatro metros.
INF1 É, é Era partida em quatro, as linguiças do porco. Desculpe de eu não lhe ter dito no princípio mas não me veio à ideia.
INQ2 Não faz mal.
INF1 Partido em quatro ou partido em seis, conforme as pessoas querem. Que não se podia encher toda de [vocalização] – já se sabe que não. Porque, às vezes, ela chega mesmo a arrebentar [vocalização] mas é quando é muito cheia. E, então, pica-se para aquela moira sair. Pica-se a linguiça bem picadinha, dum pico a modo duma agulha ou ou como a gente tem… E pica-se bem picadinha que é para sair a- aquela moira – está percebendo? –, para sair aquela moira toda. E [vocalização] depois de a linguiça estar pronta, 'enxuta-se' bem enxutinha e pendura-se nos paus.
INQ2 Que tamanho é que tem uma linguiça?
INF1 Como é que tem uma linguiça?
INQ2 Que tamanho?
INF1 Pois olhe, há-de ter aí uns [vocalização] dois metros, dois metros e meio, coisa assim. Põe-se em quatro, [vocalização] presa no pau – em quatro ou, ou em ou em cinco, como a gente vê para ficarem todas ao nível. E pendura-se, então, onde se quer fazer o lume. Faz-se o lume por baixo delas. No primeiro dia ninguém as põe assim, porque se for com muito lume, elas arrebentam todas – escacham. É preciso ser só [vocalização] à maneira que a gente vai vendo. E vão-se virando no pau. Têm-se aí, [vocalização] aí uns quinze dias. Sempre todos os dias a fazer lume, a virá-las dum lado e doutro, para ela curar bem curadinha – a linguiça. E [vocalização] depois, quando a gente vê que a linguiça que está bem curadinha, [vocalização] tira-se para fora, lava-se bem lavada – já se sabe –, que ela tem muito fumo. E [vocalização] E então, 'estrala-se' em graxa; ou há pessoas que guardam na caixa – também podem-na guardar assim. Há pessoas que também que que a guardam sem a estralarem: botam-lhe a graxa, então, bem fervendo – a banha – bem fervendo, em cima. E aí está a linguiça para todo o ano.