INF1 Chamava-se para abafar a terra.
INQ1 Rhum-rhum.
INF1 Porque a terra não podia estar muito tempo exposta [pausa] ao sol.
INF2 Para ficar com uma humidade.
INF1 Porque se se a gente se desmazelasse e deixasse ficar a terra ali umas horas durante a manhã do dia, a terra secava e depois a semente não nascia.
INQ1 Pois.
INF1 E E já se vê: hoje semeia-se e e até se rega para semear.
INQ1 Rhum-rhum.
INF1 Mas antigamente não se pensava nisso. E ninguém ia regar para semear. De maneira que quando o milho não nascia, causava nessa sementeira vários problemas. [pausa] Não era só o não nascer; era era mais complicado. É que, por exemplo, um campo tinha mais humidade dum lado e não tinha no outro, nascia no que tinha húmido e no outro não… E depois o campo ficava cheio de peladas.
INF2 Sim.
INF1 Porque o milho do terreno que secou e que não nasceu, só vinha depois nascer quando viesse chuva, que às vezes levava muito tempo.
INQ1 Pois.
INF1 E depois o campo tinha umas peladas nos primeiros tempos e depois tinha um milho que vinha depois do primeiro.
INQ1 Pois.
INF1 E como se sabe, depois a colheita tornava-se também complicada, porque ia-se colher, colhia-se todo e depois um vinha verde, outro vinha maduro – essa história. De maneiras que era necessidade, como já disse, gradar a terra quanto antes. Para isso se costumava ter sempre uma junta de bois [pausa] sobresselentes, [pausa] principalmente para a frente, para não meter os que andaram a vessar.
INQ1 Rhum-rhum.
INQ2 Porque estavam cansados?
INQ1 Já estavam cansados.
INF1 Porque estavam cansados. E era uma opressão, porque a grade de d- de dentes puxava muito, porque é aqui à frente.
INQ1 Rhum-rhum.
INF1 Eu chamei muitas vezes o gado [pausa] a vessar, e ainda numa época… A gente dizia: "Ainda cai neve negra". E eu enfiava… Porque naquele tempo, infelizmente, até nem nem luvas se falava muito nisso, e eu andava com a mão no bolso e andava com a mão que tinha de andar na soga dos bois com uma meia de lã.
INQ1 Pois.
INF1 Porque luvas, não se falava muito em luvas.
INF2 Pois, pois, pois.
INF1 E eu
INQ2 Mas o que é que queria dizer isso: "Ainda cai neve negra"?
INF1 Como?
INQ2 O que é que isso queria dizer: "Ainda cai neve negra"?
INF2 Porque não se via.
INF1 Era, er- Porque eram as últimas neves ainda do ano, ainda caía neve, às vezes, já já em Maio.
INF2 Mas o que é não se via. A terra A terra ficava dura como com a neve mas não se via a neve.
INF1 Isso.
INQ1 Ah!
INF1 É. Às vezes, diz-se: "Ainda cai neve negra"!
INF2 Neve negra, era.
INF1 Isso. A dona Cunegundes sabe como eu, [pausa] e quando eu digo estas coisas, a senhora recorda-se perfeitamente delas.
INF2 Sei. Muito bem. Muito bem.
INF1 Era assim.
INF2 Era.
INF1 Era.
INF2 Certas coisas, é claro, estás mais dentro, sabes…
INF1 De maneiras que [vocalização] consistia… Con–, a primeira grada- A primeira gradagem – não sei se tomou já nota – consistia em: chamava-se abafar a terra.
INQ1 Sim.