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PIC08

Bandeiras, excerto 8

LocalidadeBandeiras (Madalena, Horta)
AssuntoNão aplicável
Informante(s) Carina

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INQ A senhora trabalha na fábrica, é?

INF É, sim senhora.

INQ Trabalha?

INF Mas eu não trabalho efectiva. Trabalho durante o Verão.

INQ É nas conservas?

INF É, sim senhora. Trabalhamos em em albacória, traba- em bonito, em chicharro [pausa] estes peixinhos assim , cavala. [pausa] É nos peixinhos que vai aparecendo [pausa] é que nós trabalhamos.

INQ Pois.

INQ E chega a esta altura do ano e as pessoas vão para casa e não ficam a ganhar nada?

INF Olhe, minha senhora, ainda a semana passada ainda recebi o meu chequezinho. Fui quatro bocadinhos, não foi dias por em cheio porque faltou óleo, mas ainda recebi novecentos e [vocalização] tal escudos, perto de mil. Ainda um jeitinho.

INQ E à senhora também faz jeito trabalhar uma parte do ano?

INF É, sim senhora. Quando a fábrica abre Ele eles queriam que eu entrasse de efectiva, mas eu não pude entrar de efectiva porque eu sou sozinha e também gosto Crio os meus bichinhos, crio o meu porco, crio as minhas galinhas, tenho o meu marido, tenho a minha filha, é preciso fazer almoço e jantar e ceia e agora de Inverno os dias são muito pequeninos. As manhãs não para fazer o serviço para se poder caminhar; e também a gente, à noite, chegamos escuro, não se pode. basta se ir trabalhando assim nesta época do Verão.

INQ Trabalham muitas mulheres?

INF Há-de trabalhar talvez para umas trezentas mulheres.

INQ Também assim? vão alguns meses?

INF Assim, durante Não senhora. Tem uma uma parte delas, talvez para umas vinte cinco, vinte cinco a trinta, efectivas. Umas a bater latas, outras a enroupar latas, outras a fazer os caixotes para [vocalização] fazerem o embarque, [vocalização] outras na latoaria a fazer lata de Inverno para se poder trabalhar de Verão. Tem uma parte dos homens também que trabalham, porque aqui isso acaba agora esta época, mas engeiram-se daqueles carris, daquelas coisas, a limparem aquelas ferrugens para chegar outra vez para o Verão, aquilo estar tudo oleado, estar tudo em ordem, e poderem mexerem no peixe. [vocalização] Quer dizer, sempre que fazer para umas certas pessoas todo o ano. Nascem para isso.

INQ E a senhora tem vivido sempre ?

INF Como?

INQ Tem vivido sempre ?

INF Eu sou Eu sou mesmo daqui da das Bandeiras.

INQ Nunca esteve por fora?

INF Não senhora. A senhora também é daqui do Pico?

INQ Não, eu sou do continente.

INF A senhora é do continente?!

INQ Sou de Lisboa.

INF Ah! Eu tenho uma cunhada minha que é na [pausa] em Amadora.

INQ Ah!

INF Mas ela agora está para a França. Tiveram aqui dois anos. Têm três miúdos: têm um miúdo e teve dois gémeos. [pausa] Mas estão bem , à conta de Deus. [pausa] Eu então agora estou velha para viajar. Risos agora paro por aqui.

INQ Não está nada!

INF Tenho uma miúda com dez anos.

INQ O quê? Que idade é que tem?

INF Tem dez anos, a miúda.

INQ A senhora?

INF Eu tenho quarenta e seis. estou muito velha!

INQ Está velha?! Está nada velha! Está óp- Está óptima!

INF É uma vida! Quarenta e seis, estou muito ruça. O trabalho come a gente. É verdade.

INQ Está com uma cara muito novinha.

INF Tenho quarenta e seis, o meu marido tem cinquenta; e tenho uma miudinha com dez. quando ela nasceu, ia fazer dezassete anos que eu estava casada.

INQ Isso é que foi uma surpresa!

INF É verdade! não se fazia conta disso. Mas eu , eu aborreço-me com ela, às vezes, porque ela é assim viva viva ou esperta! Ele a gente diz uma coisa e compreende aquilo; ou manda-se um mandalete, faz aquilo tudo. Não se há-de dizer uma coisa, se ela não é criança esquecida! Se lhe eu disser: "Olha, tu vai ao botequim e compra-me isto e isto assim" E sabe muito bem fazer as suas contas ao dinheiro. Mas às vezes chateio-me, faz assim uma pergunta, uma pessoa aborrecida com o trabalho não tem pachorra. E eu agora outro dia, fui assim: "Ó Carla, cala-te! Tu não és do tempo"! E olhe a senhora que eu depois fiquei tanto preocupada! Chegou-se à tarde, ao fim do turno da manhã, ela diz: "Ó mãe, diga-me como é eu não ser do tempo"? E eu queria dizer que ela tinha vindo tarde e que não tinha pachorra. E eu fiquei depois tan- tanto surpreendida em ter respos- respostas indecentes, que eles não têm culpa, não é verdade! E é assim. Pois eu tenho andado também com um cheirinho de gripe, estou meia rouca, constipada. Depois foi-me para a garganta.

INQ Adoentada?

INF Então a senhora veio dar uma volta por abaixo, então! Ver estes nossos picos, estas pedras negras e estes matinhos verdes.

INQ Não é bonito?

INF Não.

INQ Não é?

INF A gente, às ve-, não acha, aqui isto.

INQ Ah! É tão bonito!

INF pessoas que vêm daí de fora que acham muito graça neste meiozinho aquilo e essa coisa ; a gente vive aqui entre matos e pedras.

INQ É muito bonito!

INF Agora é verdade que umas hortinhas , que a gente tem sempre as nossas hortaliças, calha muito bem!

INQ Pois.

INF nesses mundos deles, é preciso eles irem todos os dias ao mercado, é preciso haver dinheiro grosso. E a gente aqui, é os nossos nabos, é o nosso feijão, é batatas doces e é batatas brancas, é os nossos inhames, é tudo. [vocalização] Não se pode cramar. As hortinhas são fraquinhas mas disso tudo.

INQ Claro.

INF É isso.

INQ É muito diferente! Viver aqui ou viver em Lisboa é muito diferente! É muito melhor viver aqui!

INF É o que eles dizem.

INQ A sua irmã gostava de estar em Lisboa? Na Amadora?

INF Era uma cunhada.

INQ Uma cunhada?

INF Ela não era nascida de ; era do Alentejo.

INQ Ah!

INF Ela trabalhava em va- Ela também trabalhava [vocalização] em Lisboa, que ela trabalhava por conta dum alfaiate. Trabalhou muito ano por conta dum alfaiate onde ela estava. Eles estiveram dois anos. Foram para a França, e estiveram dois anos. Ela prometeu-nos vir dali a cinco anos. Vamos a ver. Tenho é muitas saudades dos miudinhos, que eram uns miudinhos que ainda não tinham um ano e eram gémeos! Mas muito branquinhos, muito gordinhos, muito lourinhos, avermelhadinhos até do cabelo. Eram tanto engraçados, filhos da minha alma, mas é tanto longe! no fim Eles estranhavam mas depois Eles estranharam muito mas no fim [pausa] ficavam comigo, aqui de noite, a dormir. E a mãe ia, às vezes, dar um passeio, mais o marido, iam ver-me isto , que ele gostava também de lhe amostrar isto e ela e ela gostava. estranhava muito é que não tínhamos luz. Mas nós agora temos luz. Assim como a minha casa, a gente chega-se à noite, eu faço o meu serviço aqui brancamente com a luz. é então uma animação. A gente estava aqui, vivíamos muito apertadinhos sem uma luz, sem águas, sem nada Águas, a gente tem nos nossos tanques, mas agora a luz, credo, Pai do Céu! É claro, é uma animação! Foi o melhor que fizeram foi a luz!


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