INF E andar era assim na, na adiante do gado, todas molhadas! Não havia plásticos, nem… Agora ele já há saias plásticas. Nesse tempo não havia.
INQ Pois, nada.
INF [vocalização] Andávamos todas molhadinhas…
INQ Era tudo muito pior, não é?
INF Sim. Ai, tudo muito pior! Olhe, os nossos filhos – os meus filhos, os da minha mãe – eram criados por lá numa cesta e numa poceira, ao pé da gente. [pausa]
INQ Levavam-nos para o campo e estavam lá?
INF Levávamos para a gente. Uma ocasião um o meu [vocalização] andava na… Eram dois filhos que eu tenho. E andávamos a sachar e andávamos então, [vocalização] "Ó João, ó Edgardo", que é…
INQ Os seus filhos.
INF É. E depois, o [vocalização] o outro meu filho vai assim: "Ó mãe, ó pai, venha cá que o Édipo diz que está aqui no poço, está aqui na água"! E ele lá estava [pausa] metido e o engenho a andar.
INQ Ai coitadinho!
INF E ele agarrado a umas ervazitas que lá estava. E depois a gente lá o tirou, lá o lavou, lá o vestiu, tudo. E houve havia outra senhora aí que também andava… [vocalização] Havia assim uma estrada ali assim às marinhas – chamávamos-lhe as marinhas do arroz. E o menino era um menino muito lindo, muito lindo! E E caiu a poceira. [pausa] Virou-se e o menino virou-se para a barroca.
INQ Ah! E então?
INF O pai O pai andava lá e a mãe, ali foi fino: agarrou o menino para ele, quando o agarrou já estava morto.
INQ Ah!
INF Agarrou o menino para ele, chegou a casa com ele, e depois ainda chamaram o médico, ele deu uma injecção mas o menino estava morto.
INQ Pois. Já estava morto.
INF Já estava morto.
INQ Morreu afogado.
INF Porque morreu…
INQ Nessas marinhas, nessas barrocas havia água.
INF Nessas barrocas. Que havia assim: [vocalização] a água do arroz era mais baixinha, mas havia umas barrocas e havia uma estrada. E o menino virou-se e [vocalização] para a barroca. Depois
INQ Caiu. Mas era bebé ainda?
INF Ainda era bebé. Ele era bebé.
INQ Está bem.
INF Outro, também iam para a banda dalém, passavam ao rio, tinha uma assim uma ponte – mas era estreitinha –, caiu para a água também morreu. Queriam ir para a banda dalém, caiu para a água, também morreu. Noutros tempos, já viu?
INQ Pois.
INF Noutros tempos antigos, não é?
INQ Pois.
INF E o tempo de agora… Antigamente, quando [vocalização] os rapazes iam à tropa, faziam então: compravam uma roupa toda igual e faziam um baile. Vinham já com o baile de Coimbra. A gente ia daqui que [vocalização]… Fritávamos bacalhau, naquele tempo, e queijo, e íamos para Coimbra c- com os cestos – eu não sei se a senhora doutora sabe disto?
INQ Não, não, não.
INF Íamos então para Coimbra com os cestos, eles depois vinham; depois o o pessoal que ia connosco, íamos íamos comer todos.
INQ Todos juntos.
INF Levávamos vinho,
INQ Pois.
INF o bacalhau frito e o queijo.
INQ Pois.
INF E comíamos todos juntos. E eles depois vinham – tinham um toque – vinham, iam daqui a tocar para o para o rio [pausa]
INQ Ah!
INF ao pessoal, que era o pessoal, era cachopas de todas as… Chamávamos-lhe a mota do rio. Ele não estava assim. Era no outro tempo.
INQ Pois. Estava mais baixo, não era?
INF E depois vínhamos então a dançar aí pelo caminho, e tudo, e eles a tocar, e tudo. Depois faziam um baile e a roupa era toda igual.
INQ Que maravilha!
INF E agora já não.
INQ Pois.
INF Agora já não há nada disso.
INQ Agora já não há nada disso.
INF Não senhor.
INQ Quando vão para a tropa… Qualquer dia já nem vão para a tropa.
INF [vocalização] Ele não. Era uma mocidade muito linda!
INQ Pois.
INF Quer dizer, e andava-se a mondar, e sentia-se ali um rancho a cantar, e ali outro rancho a cantar, outro. De noite, na, nas escamis- a escamisar – chamávamos-lhe a escamisar –, juntavam-se de noite… [vocalização] Hoje íamos escamisar a de desta vizinha, ao outro dia íamos escamisar a de outra vizinha…
INQ Isso era do milho?
INF Era do milho. E vinham os rapazes e vinham esca- escamisar mais a gente.
INQ Pois, pois, pois.
INF Pois vinham. E E assim. Bem, era estas coisas tudo assim.
INQ Pois, pois, pois.
INF E a vida era muito difícil. Noutro tempo já era mais difícil que a- que agora já mais no nosso tempo.
INQ Agora é mais… Agora é melhor.
INF Porque era tudo feito à mão.
INQ Pois.
INF Era tudo feito à mão: tudo feito de enxada. Aquelas inças que a gente tinha à borda do rio, que o rio agarrou, tinham então os olheiros. Era o arroz todo acartado para lá, [pausa] que a, que a que a zorra não entrava lá. O gado não entrava lá.
INQ Não?
INF Era tudo cavado com uma enxada. Era às vezes ao domingo, uns ranchos de homens e ia da daqui com com o comer com uma cesta à cabeça para o campo, para dar o comer aos homens.
INQ Rhum-rhum.
INF Eles a cavarem com uma enxada, a virarem aquilo. Que não se entrava lá, nem o gado, nem nada!
INQ Pois.
INF E o arroz era todo acartado para lá para plantar e depois era todo acartado à cabeça para essa mota do rio ou para a estrada.