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UNS29

Unhais da Serra, excerto 29

LocationUnhais da Serra (Covilhã, Castelo Branco)
SubjectNão aplicável
Informant(s) Dimas Dídia Diodoro
SurveyALEPG
Survey year1997
Interviewer(s)Gabriela Vitorino João Saramago
TranscriptionSandra Pereira
RevisionAna Maria Martins
POS annotationSandra Pereira
Syntactic annotationMélanie Pereira
LemmatizationDiana Reis

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INF1 acartei tanta! Tanta eu acartei! Andava na fábrica e tanto eu trabalhei para criar cinco filhos! Ah!

INQ1 Pois.

INF1 Nem quero que me lembre! E com más passagens e tudo! Olhe aqui um grande calo! Tanto molho acartei!

INQ1 Estou a ver, estou.

INF1 Que nunca se vai embora. Ai! Eu quando ia para a fábrica, ia maçado que eu sei !

INQ1 Claro.

INF2 O meu pai sabe fazer de tudo! Tudo!

INF1 Ai, eu sei fazer de tudo. Tudo!

INQ2 Sim senhor.

INF2 Ele é que limpa a casa, ele é que faz tudo!

INF1 Mesmo agora Mesmo agora, [pausa] as posses não são assim muitas e eu [vocalização] me mete medo as coisas, não é?

INF2 E percebe de tudo!

INF1 Que a idade também

INQ1 Claro.

INF1 Mas sou muito jeitoso para tudo! Tudo!

INF2 O meu pai faz de tudo! [pausa] Percebe de tudo na na agricultura. Percebe de tudo!

INF1 Mas tan- Mas tanto trabalhinho eu levei! [pausa] Fui tropa em 35. [pausa] Fui tropa em 1935. [pausa] Sabe quanto é que levei para a tropa? Setenta paus. Setenta escudos. [pausa] E sabe onde é que os ganhei? [pausa] A faltar alguns dois meses ,[pausa] quando saía da fábrica à uma hora da noite, todas as noites dois molhos de mato para vender. [pausa] Era duro!

INQ1 Pois, claro.

INQ2 Pois, assim

INF1 Saía da fábrica à uma hora da noite [vocalização], quando havia boa lua

INQ1 Rhum-rhum.

INF1 Todas as noites dois molhinhos de mato para vender. Ia rou- roubar para . Ele havia para tanto!

INF3 Onde é que o havia!

INF1 Foi quanto quanto levei para a tropa.

INF3 Também era preciso muito molho para dar aquele bocado.

INF1 E depois tirei número alto. [pausa] Tirei número alto, [pausa] vim-me embora aos três meses. davam comia-se bem, mas o que eu não gramava era a sopa da couve. Eu estive em Vendas Novas.

INQ2 Rhum.

INF1 Nunca ouviu falar em Vendas Novas?

INQ2 Sei, sei, sei onde é que é.

INF1 É Alentejo. Eu fui para assim muito mimoso, com a aguinha, cheguei , água dos poços, aquilo foi duro! E comia-se então muita couve, muito grão, mas à quinta-feira davam um copinho de vinho. [vocalização] Muito grão e assim, mas aparecia aquela cou- aquela couve grande, com um troço assim, e eu nunca gostei do troço. Nu-! Nem hoje! Nós aqui fazemos a sopinha é a pontinha da couve.

INQ1 Pois.

INF1 É como digo: levei trinta e cinco paus, gastei em [pausa] em carcaças, ou um bocadinho de pão e queijo, ou um bocadinho de legume, e tal.

INF2 Setenta escudos! [pausa] Ele levou metade do dinheiro, deixou a outra metade!

INF1 Porque eu engraçava com a pouco com aquela sopa, gastei trinta e cinco escudos. Ainda trouxe outros trinta e cinco. [vocalização] Um dia estava a uma sombra, [pausa] aparece-me ali um alentejano: "Eh ! Queres comprar esta este estojo"? "Então o que é isso"? [pausa] Uma caixinha que ainda ali tenho. Aquilo até era alemão, germânico.

INQ2 Rhum-rhum.

INQ1 Rhum-rhum.

INF1 Que é uma caixinha assim quadrada, forrada de veludo de veludo e com [pausa] com uma gilete dentro [pausa] dentro da caixinha.

INQ2 Rhum-rhum.

INF1 Aquilo é de desaparafusar Digo-lhe eu: "Quanto é que queres por isso"? "Dás-me cinco paus". Peguei nos cinco paus: "Toma "! Arranjei uma caixinha Hav- Havia ali um monte de biciclete de aluguer, o gajo aluga uma biciclete uma hora, ficou sem dinheiro. Eu a gilete ainda a tenho. Como é que a vida pode ser igual?

INQ1 Pois.

INF1 Não pode. Que uns estragam e outros não! [pausa] Ainda a tenho, que [vocalização] para a minha vida.

INQ2 Pois.

INF1 Pois desde 35.


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