INQ1 Agora à hora do calor, elas estão no quê?
INF1 Acarradas. Estão a aca- a acarrar. Chamamos-lhe o acarrar, à sombra, pronto. "Vamos a acarrar o gado", pronto.
INQ1 Chama-lhe o acarro?
INF1 Acarrá-las, pronto. A acarrá-las. Logo à tarde a ir embora: "Vamos a abalá-las",
INQ1 Sim senhor.
INF1 a abalar embora. Agora é o acarrar para para descansarem, para acarrarem, para dormirem.
INQ1 Rhum-rhum.
INF1 E logo é o abalar, é comermos, irmos a comer.
INQ1 Mas aquele sítio onde as ovelhas acarram?…
INF1 É o acarradouro mesmo. Chamamos-lhe o acarradouro.
INQ1 O acarradouro.
INF1 Num olival ou [vocalização] num pinhal, é o acarradouro. Ou [vocalização]…
INQ1 Pois.
INF1 Pronto, numas árvores qualquer é o acarradouro delas.
INQ1 É onde elas estão agora há dias?
INF1 Onde elas estão é num olival. Estão aí num olival.
INF2 Atrás da igreja.
INF1 Pronto. Estão ali ao, aí, além, ao pé daquela igreja que se vê.
INQ1 Ah, portanto as suas não são aquelas que estão aqui assim?
INF1 Não. As minhas estão detrás daquela igreja além.
INQ1 Sim senhor.
INF1 E [vocalização] as que estão aqui em cima, logo vieram de cima, deve ser do tal Cícero. Logo aqui ao cima,, [pausa]
INQ2 Sim.
INF1 é do tal Cícero. [vocalização] Pronto, é como digo…
INQ1 As suas estão lá em baixo?
INF1 Estão lá ao pé daquela igreja, detrás da igreja.
INQ1 Sim senhor.
INF1 Portanto, é como digo: alo- agora foram a acarrar e logo vamos a abalá-las para ir a comer, pronto.
INQ1 Olhe, e aquela, aquilo que se tem que tirar por fora às ovelhas?
INF2 A lã.
INF1 Isso é lã.
INF2 Tosquiá-las.
INF1 Chamamos lã.
INQ1 E chamam?…
INF1 Tosquiar o gado. Vamos a tosquiar.
INQ1 Tosquiar. Em que época é que se tosquia?
INF1 É em Março, normalmente. Nós aqui é em Março; há outros que [vocalização] que é em Maio, outros em Abril.
INQ1 Pois. Depende.
INF1 Depende das zonas. Lá para cima ainda são capaz quase de haver agora por tosquiar, de Mogadouro por aí afora, para a Espanha, nesses lugares. Mas nós aqui, o nosso costume aqui é: pegam em Fevereiro, ali para a ribeira, ali para baixo, que é um terreno quente. Fevereiro e Março por aqui [vocalização], nestes arredores perto, [vocalização] tosquiamos por Fevereiro e Março.
INQ1 Pois. E depois o que é que fazem à lã?
INF1 Depois vende-se.
INQ1 Vendem?
INF1 Há uma há uma…
INQ1 Como é que se chama à lã toda duma ovelha?
INF1 Há uma pessoa… Um velo. Um velo duma ovelha.
INQ1 Rhum.
INF1 Porque antigamente – agora já nem tanto –, mas antigamente, enrodilhava-se aquilo, ficava ali num molho muito bem arranjadinho. Havia pessoa já própria… Agora não. A gente agora mete-as dentro dum saco. Agarra, mete dentro dum saco. Mas antigamente não. Aquilo antigamente era uma coisa muito bem arranjada. Havia uma pessoa então própria: [pausa] a ovelha, tirava-se-lhe a lã, [pausa]davam-lhe ali umas voltas, aquilo ficava tão preparado, tão arrumado, que era como sendo com uns baraços. Dava ali meia dúzia de voltas, metia metia assim uma na outra, ficava assim, metia-lhe assim um buraco, pronto! A gente agarrava aqui nesta ponta – dali era como estando pregada ou apertada, ficava uma coisa bem armada. Agora, é claro, pronto, apareceram… Pronto. Pegaram-se a habituar a darmos sacas a quem nos as compra… É mais próprio, pronto! A gente, quem Aquilo só o fazia uma pessoa especializada, [pausa] que era preciso pagar-lhe até uma jeira mais cara. E agora assim os sacos, quem quer o faz. Até uma mulher o faz. É só arrebanhá-la e meter para os sacos e…
INQ1 Vem aí gente de fora comprar?
INF1 Vem depois uma pessoa de fora a comprar.
INQ1 Mas antigamente usava-se a lã aqui, aproveitava-se a lã aqui para fazer?…
INF1 Para fazer camisolas e [vocalização] roupas, que havia pessoas… Hoje já não há pessoas – nem que queiram – hoje já não há pessoas que sa- saibam fazer isso.
INQ1 Que saibam fazer?
INF1 Porque antigamente aquilo… Era: [vocalização] uma camisola daquilo dava um jeito para o Inverno.
INQ1 Claro.
INF1 Eu, a minha mãe chegou-as a fazer!
INQ1 Mas não é bom agora já para usar?
INF1 É bom, o que é bom! Não há quem faça!
INQ1 Ah!
INF1 Não há pessoas que o…
INQ1 A sua senhora, por exemplo…
INQ2 Essas camisolas eram o quê? Uma coisa para pôr?…
INF1 Não, não. As camisolas é, por exemplo, pronto, como esta camisa. A gente, as mulheres faziam aquilo à mão, faziam asquelas camisolas à lã à mão com aquela lã. Ora a lã, forte, boa!
INQ1 Como é que elas tinham… O que é que elas tinham que fazer antes de fazer as camisolas?
INF1 Quer dizer, fiavam aquilo. Aquilo
INQ1 Mas antes não tinham que lavar e isso?
INF1 Pois claro. Tinham que a lavar bem lavadinha, depois aquilo – chamavam-lhe fiar –, preparavam-na bem preparadinha, quem sou- quem sabia – não é? –, fiavam-na, preparavam, fa- faziam aquilo num molho – como agora um molho de lã, um rolo de lã.
INQ1 Pois, pois.
INF1 Pronto! Depois faziam uma camisola. Aquilo era coisa em condições!
INQ1 Claro!
INF1 Mas agora já não há quem faça isso, não. Agora a gente compra-as feitas…
INQ1 A sua senhora já não sabe fazer?
INF1 Não sabe. A minha nem nunca soube. Sabia a minha mãe e as antigas.
INQ1 A sua mãe sabia?
INF1 Agora estas pessoas novas, ninguém sabe fazer isso.
INQ1 Agora ninguém sabe.
INF1 Agora, compra a gente as coisas todas feitas a m- a imitar a lã das ovelhas. Mas, oh!, é a imitar!
INQ1 Claro, que aquilo não tem o valor que tem a lã.
INF1 [vocalização] Oh, vagar! Ah! É. Por acaso, isso era, era, era era grande… Era uma coisa muito boa! Pronto! Era Era uma coisa que valia muito dinheiro.
INQ1 Olhe, e cobertores também faziam?
INF1 Faziam também os cobertores. Fábricas… Bem, cobertores até ainda hoje é capaz de haver. Porque eles compram-na [vocalização], para essas coisas deve ser. O que, é claro, já é natural que já lhe misturam mais coisas porque a gente vê a- as roupas a vender já não são como eram.
INQ1 Pois não.
INF1 Fazem-lhe outras misturas, à lã, e outras misturas e tal…
INQ1 Não é nada…
INF1 Agora antigamente faziam-nas só da própria lã – era dos tais cobertores que eu dizia que punham às costas duma pessoa –, isso isso, uma pessoa, aquilo…
INQ1 Esses cobertores levavam depois assim o pêlo puxado, não era?
INF1 Era. Ficava o pêlo… O pêlo é como os pêlos da gente: aquilo ficava assim fora.
INQ1 E como é que eles faziam isso, sabe? Não?
INF1 Isso é coisa que não sei. Nunca vi essa fábrica de fazer isso.
INQ2 Mas, por exemplo, a sua mãe, que fazia essas camisolas e assim, de certeza que tinha uma coisa assim com uns pregos, para passar na lã para ficar a lã direita. Portanto…
INF1 Tinha, pois. [vocalização] Chamava-lhe a gente, quer dizer, escová-la bem escovadinha. Aquilo Aquilo, pronto! Preparavam-na bem, era… [vocalização] Aquilo depois de [vocalização] estar lavadinha, estendiam-na na, no numa tábua assim alta, e aquilo – como quem penteia uns cabelos!
INQ1 É.
INF1 Como quem penteia uns cabelos, e tal. Aquilo [vocalização] ficava bem penteada, bem preparadinha. Depois então tinha uma, chamavam-lhe uma roca para a para a fiar,
INQ2 Pois.
INF1 para a enrodilhar, pôr num rolo.
INQ1 Pois, pois.
INF1 E então depois pegavam a fazer a camisola. Era. Era isso tudo.