INQ Olhe, qual foi o momento mais difícil que o senhor passou na pesca da baleia? Lembra-se assim de algum caso especial?
INF1 Pois se tive algum caso especial? Não senhora. Eu nunca tive… Já vi, já revirei algumas vezes e já quebrei. Ele baleia já [verbo] para o bote. Pois aquilo são tudo momentos difíceis, [vocalização] mas quer dizer, nenhum nenhum foi [vocalização] assim que fosse marcado, não senhora. Já se passou alguns maus, mas mas foram vários, não teve assim nada dum especial. Não senhora.
INF2 O mais difícil talvez de cá, seria meu irmão que poderia dizer alguma coisa…
INF1 Ah, esse está bem.
INF2 Quando quebrou… Quando o bote partiu, que levou foi oito pontos numa perna.
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INF2 Esse é que lhe podia dizer alguma coisa. E [vocalização] cortou-se na na testa… Esse, o Barrabás, é que podia dizer alguma coisa. Agora o mestre Balduíno também já revirou e a gente lá fora quando se revira, [pausa] a gente tenta é se salvar, não tentamos pensar no perigo. Naquelas alturas, não. E isto é como como uma pessoa que gosta duma rapariga: quanto mais me bates, mais eu gosto de ti. A baleia é assim. Fomos criados nisto!
INF1 Ah! Este senhor é assim. Vamos andando para aí com essa vida, pois é. Acontece [pausa] coisas más lá fora, acontece coisas más. Mas, é claro, são várias que acontece e depois a gente já estamos mais habituados, prát-, feitos à coisa, não é verdade? De forma que… [pausa] Caso especial, nunca por acaso, nunca tive. E oxalá que não os tenha. Já houve
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INF1 Já houve infelicidades nesta pesca. Aqui mesmo no lugar, já houve aí um rapaz que [vocalização] a baleia [vocalização] o outro deu, tombou, e [vocalização] a linha, com certeza, pegou-lhe, [pausa] e lá o levou. Nunca mais apareceu. E já houve mais uns casos desses. Um nas Lages, creio eu, e outro na Calheta. Mas isso já não é também do meu tempo. Este rapaz aí que morreu, que eu estou falar, é acima de mim talvez uns três anos – três, quatro anos acima de mim.
INF2 Mas o Bártolo é do tempo do mestre do mestre Balduíno de arrear à baleia.
INF1 É. É, é. Mas ele novo veio assim, é mas é da Calheta.
INF2 Pois.
INF1 Pois. [pausa] Pois, sabe, nesta vida tem havisto também as suas coisas. Tem havisto estas coisas. Mas eu, graças a Deus, até aqui, ainda felizmente, não as tenho assistido ainda assim muito. Claro, os tempos difíciles, os momentos difíciles encontra-se; também já os encontrei. Mas, um caso especial, não.
INF2 Isto o melhor era não acabar. Porque isto foi funda- isto foi fundado com homenzitos tudo pobres. Entravam [vocalização] com três contos, ou mil e quinhentos, ou mil escudos… Com tantas dificuldades na vida e é que foram fazendo este progresso da vida da baleia. E chegou-se a ponto que nem toda a gente arreava a baleia aqui. Mesmo dos sócios, tão depressa o foguete atirava, o bote já estava na água. Estavam ali de manhã só a vigiar o foguete da vigia.
INF1 Ah, pois!
INF2 O mestre Balduíno lembra-se disso. Eu já não me lembro disso mas o mestre Balduíno lembra-se muito bem disso porque já arreava nessa altura. E então
INQ O primeiro que apanhasse a baleia, o bote?…
INF2 O bote ia e se houvesse um que fosse sócio, pois se não apanhou o bote, pois ficava atrás.
INF1 Bom, [vocalização] os botes aqui eram sociedade. Mas todos querem ir diante porque diante sempre calha melhor sorte, outros querem apanhar, para marcar.
INQ Ganhavam mais os que iam adiante?
INF1 Não senhora.
INQ Não?
INF1 Eram iguais. É tudo sociedade.
INF2 Quer dizer, podiam apanhar mais – que esta senhora está-se referindo a coisa. Podiam apanhar mais. Mas aquele que apanha [pausa] faz um risquinho num cepo atrás, num cepo que ali tem, e quando chega ao fim do ano, diz: "Não, tu tens dez, mas eu tenho vinte. Tu tens catorze mas eu tenho vinte cinco". Pois sortudo Pôs-se tudo é aquele que mais pode sair para ver se apanha a baleia primeiro de que os outros. É sim senhora. [pausa] Mas o mestre Balduíno é dos homens batidos aqui porque, precisamente, começou de criança; depois andou dez anos ao atum, não foi?
INF1 Ah, mais.
INF2 Mais? Doze?
INF1 Mais. Andei vários anos no atum. Vinte e três, creio eu, ou vinte e quatro. Vinte e quatro. Depois larguei e já estou aqui à baleia já havia já também há uns três anos ou quatro. Quatro é que é. Quatro. [pausa] Quatro. [pausa] E é isto, minha senhora.